Por Maria Teresa Cruz
Da Ponte jornalismo
A PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão) entrou com pedido de ação para o fim das revistas vexatórias em estabelecimentos prisionais e socioeducativos. O documento foi entregue na terça-feira (4/7) para o procurador geral da República, Rodrigo Janot.
No texto, o órgão do Ministério Público Federal afirma que a prática fere a constituição porque viola a dignidade humana. “A prática expõe as pessoas que vão visitar os parentes presos a uma ausência de direitos. Essa exposição do corpo, essa determinação de alguns exercícios, como o agachamento, são extremamente agressivos, especialmente porque estão em espaços policiais, espaços predominantemente masculinos. A outra dimensão imposta é que esse tipo de constrangimento acaba por afastar a família do próprio preso e isso prejudica o processo de ressocialização que deveria ser um dos objetivos da pena”, explica a procuradora federal Deborah Duprat. “A prática é também condenada internamente. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária já se manifestou nesse sentido, assim como o Conselho Nacional de Justiça”, afirma a procuradora.
Deborah lembra que estados como São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Goiás contam com leis que buscam inibir a prática e “há relatórios de organismos internacionais, incluindo da OEA, mas nada mudou”, disse.
A expectativa é que o procurador geral da República acate o pedido da PFDC e remeta o tema ao STF. Mas, segundo Duprat, não há previsão para que isso aconteça. “Nós temos, por exemplo, nos aeroportos, o risco de entrada de substâncias ilegais e há os scanners para isso. Isso implica investimento.
Mas a gente não pode, sob a alegação de não ter recurso, naturalizar essa prática como necessária ou recomendável. É uma prática abjeta. E não faz sentido. Sugerimos na ação como medida provisória a revista nas celas, por exemplo”, afirma Deborah Duprat. “A partir de várias pesquisas, as revistas nas celas tem se mostrado muito mais eficazes”.
A alegação para quem ainda defende a revista vexatória é a entrada de materiais como celulares e drogas pelos familiares. Mas a tese é infundada. Um levantamento realizado em 2016 pela Rede de Justiça Criminal identifica que um percentual muito pequeno de objetos proibidos é apreendido durante as revistas vexatórias. No estado de São Paulo, por exemplo, apenas 0,03% das revistas íntimas geraram apreensão desse tipo de material.
Caso antigo
Em abril de 2014, a Rede de Justiça Criminal, com o apoio do Núcleo Especializado em Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, lançou a campanha Fim da Revista Vexatória, com depoimentos e dramatizações de histórias reais de parentes que sofreram violações em dias de visita em presídios. O tema acabou se internacionalizando e recebeu atenção da Corte Interamericana de Direitos da OEA (Organização dos Estados Americanos), que, à época, manifestou oficialmente o repúdio à prática, como bem salientou a procuradora federal Deborah Duprat, autora da ação de inconstitucionalidade.
Na época, a campanha promovia um abaixo-assinado para pressionar o então presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB), a apressar a votação do projeto de lei 7.764/2014, de autoria da senadora Ana Rita (PT), que previa justamente o fim imediato das revistas vexatórias e propunha uma série de medidas a serem cumpridas em âmbito nacional, entre elas a colocação de aparelhos de scanner e raio-x e, no caso da necessidade da revista manual, que ela fosse realizada em sala separada e na presença de outras duas testemunhas. Proibia também o desnudamento da pessoa, ainda que sob suspeição. Ana Rita não é mais senadora, Renan Calheiros não é mais presidente do Senado e o PL ainda não foi votado.
A última tramitação do projeto aconteceu no dia 28 de junho de 2017, com a votação da parlamentar Laura Carneiro (PMDB) na CSPCCO (Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado) da Câmara, incluindo alguns pontos e liberando para votação das duas casas.
Uma reunião extraordinária para uma última deliberação sobre o texto do PL estava marcada para quarta-feira (5/7), mas foi cancelada pela ausência do deputado federal João Campos (PRB), da bancada evangélica, que é o relator. Caso a deliberação tivesse ocorrido ontem, o texto poderia ser votado.
A Ponte Jornalismo procurou o deputado federal João Campos e questionou, por escrito, as razões da ausência do relator, o que ele pensa sobre o projeto e qual a expectativa para as votações, mas até o momento não obteve resposta.