Entre os dias 11 e 13 de março, na cidade de Goiânia (GO), foi realizado o II Encontro Regional da Pastoral Carcerária sobre a Questão da Mulher Presa. Com formações, místicas, partilhas e orações, o encontro possibilitou um final de semana com o olhar totalmente voltado para as mulheres encarceradas. Como o debate sobre a população carcerária já é bastante difícil e esquecido, é muito importante, tendo um sistema prisional pensado por homens e para homens, lembrar daquelas que são ainda mais invisibilizadas: as mulheres presas. E junto delas lembrar de seus filhos recém-nascidos, que passam os primeiros meses de vida dentro da prisão.
Organizada pela Coordenação Nacional da PCr para a Questão da Mulher Presa, conduzida pela Irmã Petra Silvia Pfaller, a primeira experiência sobre a temática foi realizada no ano passado, em Porto Alegre (RS), e contou com agentes de diversas cidades, das regiões Sul e Sudeste, em um momento de partilha de experiências e formações. O II Encontro, realizado nesse mês, contou com a presença de membros da Pastoral Carcerária de Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Rondônia, Espírito Santo, Piauí, São Paulo e Rio Grande do Sul. Em abril será realizado o III Encontro, na cidade de Salvador, com representantes dos estados do Norte e Nordeste. Essas experiências fazem parte de um projeto financiado pela entidade católica alemã Adveniat.
O cárcere e as mulheres presas
Com a ajuda da pesquisadora e professora Bruna Angotti, que acompanhou e assessorou o encontro nos dois dias, foi trabalhada a tentativa de entender quem são as mulheres presas, quais as condições em que vivem, por que a população carcerária feminina aumentou tanto nos últimos anos, e como é possível, tendo em vista o horizonte de um mundo sem cárceres, intervir nessa realidade.
A prisão, na perspectiva de Angotti, é sempre a sombra. É espaço de violência, de dor, de sofrimento. Mesmo que a passagem pela prisão seja transitória, a marca de quem viveu o encarceramento dura para o resto da vida. Marca que atinge não somente a pessoa presa, mas também sua família, aqueles que trabalham nas unidades e também os agentes da pastoral que realizam as visitas. Ela destacou a importância da presença da PCr nos cárceres: a possibilidade de trazer à sociedade o que acontece dentro dos muros é essencial para a garantia dos direitos de quem está dentro e também para difundir o sonho de um mundo sem prisões.
No caso específico da mulher, entender as condições de aprisionamento e as marcas dessa vivência na sombra passa por compreender o espaço da mulher na sociedade e as expectativas sociais que lhe são atribuídas. A prisão feminina tem a dupla função de aprisionamento social e moral: é a criminalização de quem rompeu com o papel de “ser mulher”.
E o aumento expressivo da população carcerária feminina nos últimos anos mostra um sistema de justiça cujos olhos estão cada vez mais se voltando às mulheres. E não quaisquer mulheres. Assim como ocorre com os homens presos, o processo de criminalização tem um olhar seletivo que busca especialmente mulheres negras e pobres, sobretudo mães.
E como fazer com as mulheres que são mães? O sistema prisional retira totalmente a autonomia da mulher para decidir sobre sua vida e sobre o destino de seus filhos. A prisão de mulheres grávidas faz com que bebês tenham seus primeiros meses de vida presos, mesmo com a previsão legal de prisão domiciliar! E com relação às mulheres que já eram mães, o encarceramento provoca uma ruptura profunda de laços.
Angotti lembra também que falar de encarceramento feminino é falar sobre a chamada “guerra às drogas”. No Brasil, 65% das mulheres estão presas por crimes ligados a entorpecentes e é urgente a reversão desse quadro.
Com a ajuda do Padre Almir José Ramos, assessor nacional de saúde da PCr, foram trabalhadas as questões específicas de saúde da mulher encarcerada. É visível o despreparo e a insuficiência do atendimento à saúde dentro das unidades prisionais, o que leva a um quadro de adoecimento físico e mental causados pelo encarceramento.
Falar de saúde, de autonomia, de dignidade das mulheres presas é falar, necessariamente, de desencarceramento. Pois a prisão é por excelência o espaço da exclusão, das faltas de condições mínimas, do adoecimento: é o espaço da sombra.
O encontro teve a perspectiva, dessa forma, de pensar formas de lutar contra o encarceramento. Foi trabalhada a Agenda Nacional pelo Desencarceramento, com 10 diretrizes essenciais para caminhar rumo a um mundo sem prisão.
Angotti apontou, também, a descriminalização de condutas, a aplicação do indulto, o uso da cautelar de prisão domiciliar para mulheres mães, gestantes e lactantes, entre outras medidas, como saídas possíveis. Também, o cumprimento das disposições da Lei de Execuções Penais e das Regras de Bangkok, recém traduzidas para o português.
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