“Parai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem: buscai o direito, socorrei o oprimido, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva. Então, sim, podemos discutir” (Is 1,16b-18a)
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, por meio do seu Conselho Episcopal Pastoral, reafirma, com veemência, seu compromisso com o “Pacto pela Vida e pelo Brasil”, de 7 de abril passado, assinado inicialmente por seis respeitadas instituições da sociedade civil e, posteriormente, por mais de 150 entidades, considerando que “a hora é grave e clama por liderança ética, arrojada, humanística, que ecoe um pacto firmado por toda a sociedade, como compromisso e bússola para a superação da crise atual”.
Diante da mais grave crise sanitária dos últimos tempos, com o sistema de saúde já entrando na fase de colapso, consideramos este momento dificílimo, que clama pelo efetivo exercício da solidariedade e da caridade. É tempo das palavras e atitudes serenas de paz, de fé e de esperança, de respeito às leis e à democracia. É com perplexidade e indignação que assistimos manifestações violentas contra as medidas de prevenção ao coronavírus; que ouvimos declarações enviesadas de desprezo pela vida, por parte de agentes públicos sobre a morte de milhares de brasileiros e brasileiras contaminados pelo COVID-19; que vimos acontecer eventos atentatórios à ordem constitucional, com a participação de autoridades públicas, onde se defendeu o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, a volta do AI-5 e o retorno aos sombrios tempos da ditadura; que todo o Brasil soube de denúncias acerca da politização da justiça, ferindo sua necessária autonomia de investigação.
A Doutrina Social da Igreja ensina, com clareza a intocável harmonia e cooperação entre os Poderes, base constitutiva da República, garantia do Estado Democrático de Direito, o princípio de que “é preferível que cada poder seja equilibrado por outros poderes e outras esferas de competência que o mantenham no seu justo limite. Este é o princípio do ‘Estado de direito’, no qual é soberana a lei, e não a vontade arbitrária dos homens.” (CDSI, 408).
Portanto, buscar soluções para os problemas do Brasil fora da institucionalidade democrática e em confronto com os poderes da República, coloca em risco a democracia e a integridade do povo brasileiro. Nessa perspectiva, não são toleráveis as manifestações sociais que atentam contra a Constituição, assim como não é tolerável que qualquer autoridade viole os preceitos constitucionais e despreze a vida. Espera-se das instituições republicanas, garantidoras do Estado de direito, a devida responsabilização dos que atentam contra a ordem democrática.
Reiterando o posicionamento contido no “Pacto pela Vida e pelo Brasil”, a CNBB conclama a sociedade e os responsáveis pelos poderes públicos a se libertarem dos vírus mortais da discórdia, da violência, do ódio e a se unirem no único confronto que a todos nos interessa nesse momento: a prevenção e o combate à COVID-19, em defesa da vida, especialmente a dos mais pobres e vulneráveis.
O cuidado da saúde das pessoas e da economia são fundamentais para a garantia da vida em sua plenitude e não se opõem. Na perspectiva da Doutrina Social da Igreja, a economia está a serviço da vida: “o princípio da destinação universal dos bens convida a cultivar uma visão da economia inspirada em valores morais que permitam nunca perder de vista nem a origem, nem a finalidade de tais bens, de modo a realizar um mundo equitativo e solidário, em que a formação da riqueza possa assumir uma função positiva.” (CDSI, 174).
Sob a proteção de Nossa Senhora Aparecida, Maria, mãe discípula de Jesus, irmanamo-nos na luta empenhada por justiça e paz e pela democracia plena, onde deve prevalecer o bem comum e a dignidade de cada pessoa, como partícipe da construção de uma nova sociedade marcada pela solidariedade, como nos ensina o Papa Francisco: “o risco é que possamos ser atingidos por um vírus ainda pior, o da indiferença egoísta. Um vírus que se espalha pelo pensamento de que a vida é melhor se for melhor para mim e que tudo ficará bem se for bom para mim.” (Papa Francisco, 19/04/2020).
Brasília, 29 de abril de 2020.
D. Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte, MG
Presidente
D. Jaime Spengler, OFM
Arcebispo de Porto Alegre, RS
1º Vice-Presidente
D. Mário Antônio da Silva
Bispo de Roraima, RR
2º Vice-Presidente
D. Joel Portella Amado
Bispo auxiliar do Rio de Janeiro, RJ
Secretário-Geral