PCr Nacional visita PA e constata violações de direitos e restrições à assistência religiosa

 Em Combate e Prevenção à Tortura, Notícias

Existem formas de tortura muito violentas, outras mais sofisticadas, como os tratamentos degradantes, a anulação dos sentidos ou as detenções em massa em condições desumanas que tiram a dignidade da pessoa. Paremos este horror da tortura!”.

Papa Francisco

A Irmã Petra Pfaller, coordenadora nacional da Pastoral Carcerária, e Vera Lúcia Dalzotto, assessora nacional para a questão da Justiça Restaurativa, estavam dos dias 22 de maio a 05 de junho no estado do Pará e, nas visitas aos cárceres e conversas com os agentes pastorais, constataram uma série de violações de direitos no sistema.  

A coordenadora da PCr visitou unidades prisionais do sudeste e sul do Pará, como  Vitória do Xingu e no Centro de Passagem para Presos de Baixa Relevância Criminal de Altamira, no Complexo Prisional de Marabá e unidades prisionais de Parauapebas e São Félix do Xingu.

O direito à assistência religiosa tem sido violado: em conversa com os agentes pastorais, estes disseram que a entrega das Carteiras de Identificação, documento que permite a entrada do agente religioso na unidade prisional, emitido pela SEAP (Secretaria de Administração Penitenciária), é extremamente demorada.

Há casos em que as Carteiras foram entregues após a data de validade, que é de 1 ano. Esta demora é um obstáculo à assistência religiosa, impedindo a entrada dos agentes nas prisões.

Após saber dessa situação, um ofício foi feito à SEAP pelo setor jurídico da PCr Nacional, solicitando informações sobre as carteiras, como qual o procedimento para confecção das carteiras; o procedimento para a entrega das carteiras; se é possível reduzir o tempo de confecção e entrega das carteiras. Até o momento desta publicação, não recebemos resposta da SEAP acerca do questionamento.

Não é só no Pará que a assistência religiosa é desrespeitada, isso é uma constante nas prisões de todo o país, que ignoram o próprio Acordo entre o Governo do Brasil e a Santa Sé, firmado no Vaticano, em 2008. O texto, em seu art. 8º, prevê expressamente que os integrantes da Igreja devem dar assistência espiritual aos fiéis detidos em estabelecimento prisional, bem como que a República Federativa do Brasil deve garantir à Igreja Católica o direito de exercer este serviço, inerente à sua própria missão.

Além disso, quando os agentes religiosos conseguem entrar nas unidades prisionais, são proibidos de se aproximar das pessoas presas ou de falar com elas sobre outro assunto “que não for de Deus”. Segundo relatos, perguntar um “como vai?” já é motivo para que os policiais penais reprimam o/a agente de pastoral.

Outra questão verificada é que nas visitas às unidades, os agentes pastorais são  acompanhados o tempo todo por policiais penais, na maioria das vezes fortemente armados, provocando intimidação tanto aos agentes da PCr quanto às pessoas presas, impedindo uma interação mais pessoal. 

“É impossível fazer assistência religiosa sem olhar no olho e dar as mãos aos Josés e Marias encarcerados. A proibição do contato com as pessoas presas, mesmo que dentro de suas celas, é forte obstáculo para a realização da assistência, e muitas unidades prisionais não possuem local apropriado para celebração religiosa, o que torna a própria visita nas celas regulares um recurso indispensável para o trabalho religioso no cárcere”, diz Ir. Petra.

Além disso, nas unidades prisionais visitadas, os/as agentes de pastoral são obrigados/as a realizar a assistência religiosa aos berros, pois não é permitida a entrada de caixa de som e eles/elas devem permanecer enfileirados em cima de uma linha amarela marcada no chão.

“Não é de hoje que a Pastoral Carcerária é perseguida por denunciar as mazelas do sistema prisional, mas não podemos deixar que isso continue sendo uma política institucionalizada do Estado. O direito à assistência religiosa é um direito fundamental tanto da pessoa encarcerada quanto dos/as agentes de pastoral carcerária e precisa ser garantido. A atitude de quem caminha com Deus não pode ser o medo”, afirma a coordenadora da PCr. 

Violações dos direitos das pessoas presas e dos/das familiares

A Coordenação Nacional da Pastoral Carcerária verificou também diversas situações de irregularidade e tortura dentro das unidades prisionais visitadas. Os colchões estão em falta, e os que existem são extremamente finos (do tipo “casca de ovo”), estão constantemente rasgados e sujos. 

Além disso, é vedada às pessoas presas a utilização de lençóis e somente é permitida a troca de uniformes a cada 3 (três) dias, o que agrava ainda mais as condições de higiene das pessoas encarceradas. Essa situação, somada às demais circunstâncias degradantes das unidades, resulta com que uma grande quantidade de pessoas presas desenvolvam uma infecção na pele -“pira” ou escabiose. 

Em todas as unidades visitadas, não há água gelada para as pessoas presas tomarem – somente morna. O cenário se torna ainda mais problemático no Centro de Recuperação Masculino de Vitória do Xingu e Centro de Reeducação Feminino de Vitória do Xingu, pois a água disponibilizada para as pessoas presas beberem, além de quente, é suja, com a cor marrom e gosto de ferrugem, segundo os relatos.

Em relação à alimentação, em todas as unidades os relatos recebidos indicam que as pessoas presas estariam recebendo comidas em pouca quantidade, e que os seus familiares não são autorizados a levar comida para eles durante as visitas. 

Esse cenário já foi denunciado pela PCr Nacional às autoridades em diversas outras oportunidades, tendo sido enviados diversos Ofícios e existindo inclusive uma Ação Civil Pública proposta pela Defensoria Pública do Estado do Pará. Mesmo assim, a situação de precariedade na alimentação servida às pessoas presas continua a mesma.

O banho de sol, que deveria ser diário e durar no mínimo duas horas, é feito poucas vezes por semana e, quando é realizado, não chega a 40 minutos. As pessoas presas estavam visivelmente com a pele amarela por falta de sol.

As pessoas presas trouxeram a ausência de visita íntima nas unidades prisionais do estado. Fomos informados que, no Centro de Recuperação Masculino de Vitória do Xingu, a visita íntima não ocorre há mais de quatro anos. 

A visita familiar, por sua vez, é feita sem qualquer estrutura – homens, mulheres e crianças têm que aguardar a visita em frente das unidades prisionais no sol e chuva, sendo obrigadas a fazer suas necessidades fisiológicas no mato próximo e, no caso concreto na unidade em Vitória do Xingu, sob o olhar de câmeras externas.

A Pastoral Carcerária Nacional, ainda, em visita ao Centro de Recuperação Feminino em Marabá, recebeu relatos de que haveria pessoas presas que estariam cumprindo pena em regime fechado, não obstante devessem estar em regime semiaberto, sob a alegação de que não existiria estabelecimentos adequados para o semiaberto na região.

“Ressaltamos também, a forte militarização dos servidores da administração penitenciária no estado. Durante uma das visitas, enquanto rezávamos o Pai-Nosso no pátio junto às pessoas presas, o policial penal permaneceu ao lado da agente de pastoral, fardado e com uma arma de fogo em mãos. Se é assim conosco, que estamos lá para compartilhar o Evangelho com as pessoas encarceradas, imaginem o que não fazem com os detentos e as detentas?”, conclui Irmã Petra. 

 

 

 

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