Igreja em Manaus realiza Missa da Paz pelos mortos nas prisões

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Na segunda feira, uma semana após a chacina que vitimou cinquenta e cinco pessoas e deixou muitos feridos e machucadas no sistema prisional de Manaus, a comunidade arquidiocesana, juntamente com seu arcebispo, Dom Sergio Castriani, como todas as primeiras segundas-feiras do mês reuniu-se no lugar conhecido como “Cruzeiro” para rezar pela paz. Mas dessa vez, a missa teve como objetivo principal fazer memória das 57 vidas ceifadas pelo sistema carcerário do Estado.

Acompanharam e estiveram presentes neste momento muitas pessoas, entre elas os agentes da Pastoral Carcerária da Arquidiocese, animados pelo Pe. João Poli, Coordenador Estadual do Amazonas, e Maria Nazaré, Coordenadora Arquidiocesana, além de Luisa Cytrynowicz e do Padre Gianfranco Graziola, assessores da Coordenação Nacional da Pastoral Carcerária presentes na cidade.

No final da celebração, o Pe. Gianfranco tomou a palavra, agradeceu a Dom Sérgio por sua presença significativa neste momento de memória e de esperança, além da proximidade à dor das famílias, seus anseios e esperanças, no carinho e apoio à Pastoral Carcerária e sua ação profética transformadora, que se faz presença semanal nos cárceres e também acompanha agora as famílias em sua luta por uma sociedade mais justa, fraterna e acolhedora.

Ele também fez questão de sublinhar, após ter ouvido os relatos de dor e humilhação das famílias que, contrariamente ao que está sendo divulgado pelas instituições e pela própria imprensa, “as mortes ocorridas entre domingo e segunda-feira não são um simples ajuste de contas no seio da própria facção criminosa, mas o fruto de um lógica perversa e economicista cuja responsabilidade deve ser cobrada ao Governo do Estado, às instituições do Judiciário e à própria Umanizzare, que contrária ao seu nome, é campeã de tortura, maus tratos e violação constante dos direitos básicos do ser humano”.

Em sua homilia, Padre Gianni Poli ressaltou diversas vezes a importância de transformar a cultura de morte em esperança e ressurreição, trabalhando juntos para a civilização do amor, tema caro ao Papa Paulo VI e hoje atualizado e retomado pelo ministério pastoral de Papa Francisco no tema do cuidado da casa comum e da ecologia integral. Confira abaixo a homilia na sua íntegra:

É o sétimo dia das pessoas vítimas dos massacres de Manaus. O que fazer?

Responder à violência com outra violência é perder a dignidade. Nós somos dignos de bem mais. Somos dignos de viver em segurança, e de oferecer segurança. Nós queremos fazer a diferença. Quem não respeita os direitos humanos é infrator. O estado de quem vive a cidadania, é diferente. Não pode – e não quer ser – agressivo, arrogante.

A resposta ao medo é construir confiança. O tecido social tem que ser de confiança. A resposta à chacina, é construir uma comunidade. Todos juntos: famílias, igrejas, escolas, grupos culturais, desportivos; instituição e informalidade.

Não posso ser feliz sozinho, em meio a infelizes. Nós posso estar seguro, em meio a amedrontados e assustados. Preciso ter e ser um bom vizinho.

O filho do vizinho é meu filho. Se um comunitário, um professor, uma outra criança, chamar a atenção de meu filho, tenho que ficar agradecido, não zangado.

Precisamos: não de mais polícia, ou de uma polícia livre para matar; a polícia tem que oferecer confiança, e tem que confiar em nós. A diferença está no amor.

Com o amor o cristianismo resistiu à violência e a organização do império romano. A civilização do amor resistiu à lógica iluminista e à cavalaria de Napoleão.

Não será sem custo: solidão, decepção, tribulações, falta de coragem. Jesus não esconde as asperezas que a vida nos reserva, o banzeiro que nosso barco vai enfrentar. Mas nossa sociedade precisa de amor. Amor organizado. Competente.

Repetiu para nós a Campanha da Fraternidade deste ano: quando Jesus multiplicou os pães, ordenou que se sentarem em grupos de cinquenta. Os apóstolos foram encarregados de distribuir, e no final receberam a ordem de recolher a sobra. Amor organizado.

Não políticas de repressão, mas Políticas públicas. A repressão é adubo para a árvore da morte. A falta de respeito pela dignidade que se respira nas prisões é trampolim para a falta de respeito com a vida.

Precisamos de políticas que visem o bem comum, e não a salvaguarda do bem particular. Há uma casta de preservados e defendidos, enquanto o jovem preto, pobre, da periferia é selecionado pra sofrer. Nossa sociedade precisa de esperança.

Esperança planejada. Nós acreditamos na ressurreição dos mortos. As nossas paróquias acolhem grupos GEV, AA. Aí investimos pois vimos ressuscitar homens e mulheres condenados a morrer no vício dessas dependências. Acreditamos que o Espírito Santo fala a todos os povos, inclusive povo dos maus, ao povo dos ruins, ao povo dos feios.

Nossa sociedade precisa de justiça. Não da justiça dos justiceiros – isso é vingança. Justiça é fazer o que é justo. Fazer o que Deus quer. Está é a vontade de Deus, que todos tenham vida. Vida abundante.

Padre João – Manaus

 

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