Familiares da vítimas da violência policial de São Paulo e Rio de Janeiro protestaram na tarde da quinta-feira, 6, na Casa do Povo, no Bom Retiro, região central de São Paulo, em memória aos 24 anos do massacre do Carandiru, quando 111 presos foram assassinados após uma rebelião na casa de detenção de mesmo nome, e rechaçaram as declarações do desembargador Ivan Sartori, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que insinuou nas redes sociais que jornalistas e movimentos de direitos humanos são financiados pelo crime organizado.
Às 19h, os manifestantes partiram da frente do Comando Geral da Polícia Militar, no mesmo bairro, com destino à sede do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Praça da Sé. Carregando faixas e cartazes com fotos de seus filhos, irmãos e parentes vítimas da violência policial, eles pretender ler os nomes dos 111 mortos no Carandiru e outros massacres. “Queremos jovens negros vivos. Fim do genocídio. Chega de chacina, polícia assassina”, cantavam os manifestantes em sua caminhada pela Avenida Prestes Maia.
“Quem fecha com o crime é o Estado, não as mães. Quem criou o PCC (Primeiro Comando da Capital) foi o estado de São Paulo, com a corrupção e a violência. Nós temos de fazer vaquinha até pra subir a serra para estar aqui”, afirmou Débora Maria Silva, fundadora e coordenadora do Movimento Mães de Maio. O filho dela, Edson Rogério da Silva, foi um dos 564 assassinados em 2006, durante o revide da polícia após os ataques do PCC, na Baixada Santista.
“O Judiciário tem de tomar vergonha e dizer quem matou os nosso filhos”, disse Débora. Após dez anos dos Crimes de Maio, ninguém foi responsabilizado pelas mortes. Todos os casos foram arquivados, apesar dos indícios de execução e fragilidade dos laudos periciais. O corpo do filho de Débora foi exumado em 2012 e um projétil de arma de fogo, que não constava do documento, foi encontrado na coluna dele.
No caso do Carandiru, levou 22 anos para o primeiro julgamento ocorrer. Ao todo, 74 policiais foram condenados pela morte dos 111 presos. Porém, no dia 27 de setembro, a 4° turma do Tribunal de Justiça de São Paulo anulou todos os júris do caso. Segundo os magistrados, o Ministério Público não individualizou as condutas. Sartori pediu a absolvição dos PMs e disse que eles agiram “em legítima defesa”.
“Queremos justiça, embora não acreditemos na Justiça. Além da bancada da bala, no Congresso Nacional, temos a bancada da caneta, no Judiciário. São os juízes que dão carta branca para a polícia continuar matando. E ainda querem criminalizar as mães”, disse Débora.
“Há cinco anos, quando começamos a pautar a memória do Carandiru, não acreditávamos que haveria julgamento. A pressão mostrou que é possível. Mas não houve julgamento dos mandantes. E agora um dos mandantes anulou o julgamento dos policiais”, disse Débora.
O Movimento divulgou também hoje o livro Mães de Maio, dez anos dos Crimes de Maio, que reconstrói a trajetória da luta por justiça dos familiares de pessoas assassinadas em maio de 2006. O lançamento oficial deve ser realizado em breve.
Mães de vítimas da violência policial contaram suas histórias. “Nossos filhos foram arrancados de nós. E não são só os policiais que têm as mãos sujas de sangue. O Judiciário e a imprensa também. No dia do enterro do meu filho, vi na TV que um jovem de Manguinhos morreu após trocar tiro com a polícia. O caso dele nunca foi investigado”, relatou Ana Paula Oliveira, mãe de Jonathan Oliveira Lima, morto com três tiros pelas costas, por agentes da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).
A gente luta, pede justiça, encara os assassinos dos nossos filhos. Aí finalmente chega no Judiciário e a gente acredita que esse sofrimento vai acabar. Mas eles criminalizam nossos filhos e a gente. Só questionam sobre a nossa conduta. O Judiciário mata duas vezes”, afirmou Ana Paula.
(Com informações da Rede Brasil Atual – www.redebrasilatual.com.br)