Em audiência em 7 de março na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado, representantes de movimentos sociais, dos agentes penitenciários e da sociedade civil rejeitaram o Projeto de Lei do Senado (PLS) 513/2011, que define normas para privatização de presídios, por meio de parcerias público-privadas (PPPs) para a construção e gestão de estabelecimentos penais.
Eles pedem que a proposta, que integra a Agenda Brasil, seja arquivada ou passe por um debate mais amplo. Atualmente, o projeto do senador Vicentinho Alves (PR-TO) está na Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional, o que garante uma votação ágil. Se aprovado, ele seguirá diretamente para o Plenário.
Atendendo aos apelos dos participantes do debate, o senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou requerimento para que o PLS 513/2011 seja encaminhado à CDH, à Comissão de Assuntos Sociais (CAS) e à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O requerimento foi aprovado em 9 de março e, portanto, a discussão do PLS passará pelas três comissões.
“Não há concessão referente a esse projeto; não há meio termo, não há substitutivo e não há caminho alternativo. O caminho é derrotar esse projeto”, afirmou Paulo Cesar Malvezzi Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária.
Durante a audiência, debatedores reconheceram que o sistema prisional enfrenta problemas como superlotação, celas sem condições de higiene e os presídios dominados por facções criminosas, mas rechaçaram a privatização dos presídios como solução.
“Esse não é um debate que deve ser feito de forma açodada. A inclusão desse tema na Agenda Brasil certamente não é um ganho para o Estado brasileiro”, disse o diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional, Renato Campos Pinto De Vitto.
Encarceramento em massa
Segundo o Depen, o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking dos países com maior população carcerária do mundo. São cerca de 600 mil pessoas presas atualmente. Em 20 anos (1992-2012), essa população aumentou em 380%. O temor é de que, com a privatização, a taxa de crescimento aumente ainda mais.
Para o presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e penitenciária, Alamiro Velludo Salvador Netto, a crise do sistema prisional é resultado da política criminal brasileira de encarceramento em massa.
“Privatiza-se para que o poder privado consiga aumentar os seus lucros. Portanto, privatizar o sistema prisional significa buscar mais vagas; e buscar mais vagas significa buscar mais presos. E, nesse sentido, a privatização inexoravelmente vem com um projeto de aumento do número ou aumento do número de pessoas que compõem a população prisional”, apontou.
A Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) também avalia que a ineficiência do sistema prisional não pode levar à privatização. “O ser humano jamais pode ter sua dignidade aviltada, pois lucro e pena não combinam. Um sistema carcerário privatizado abre possibilidades para mais e maiores penas”, salientou Carlos Alves Moura, ao ler nota da CNBB sobre o tema.
Custos
Um dos argumentos frequentemente levantado por defensores da privatização é de que a medida garantiria a redução dos custos do Estado com os presos, o que foi rebatido durante a audiência pública. Enquanto nas penitenciárias públicas o custo mensal varia de R$ 1.300 a R$ 1.700 por preso, em Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, a primeira penitenciária privada do País, o repasse estatal é de R$ 2.700.
“O Estado está pagando mais para fazer a mesma coisa. E a diferença disso é simplesmente a margem de lucro do administrador. Então, não faz qualquer sentido que a gente aposte em um modelo mais caro e que, se não é pior, é a mesma coisa do que o modelo público”, criticou Bruno Shimizu, coordenador auxiliar do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Os presídios privados também não melhoram necessariamente as condições de vida dos presos segundo Pétalla Brandão Timo, da Conectas Direitos Humanos. “Eu posso mencionar aqui o exemplo do sistema capixaba, do Espirito Santo, ou seja, nas unidades que são administradas por empresas, os detentos têm regimes desproporcionais de confinamento, permanecendo trancafiados em celas por mais de 23 horas, tendo direito apenas a 30 segundos de banho diário, segundo essa lógica norteada pela redução de custos”, acusou.
Inconstitucionalidade
Debatedores afirmaram ainda que o projeto em análise no Senado é inconstitucional e delega à iniciativa privada a função mais primitiva do Estado, que é o poder punitivo.
“O projeto de lei viola frontalmente o disposto no art. 144 da Constituição Federal, que acomete ao Estado a potestade da gestão da segurança pública, estando aí incluídos evidentemente tanto a imposição quanto o acompanhamento de penas aflitivas, como é a pena privativa de liberdade”, argumentou Eduardo Galduróz, da Associação de Juízes pela Democracia (AJD).
Agentes penitenciários avaliam que a privatização de presídios pode representar redução salarial para esses profissionais. “Precisamos discutir também qual a importância do agente penitenciário, uma categoria que até hoje não é reconhecida pela Constituição do Brasil, não tem uma regulamentação que diz o que ele é, o que ele faz, qual a importância do seu papel, então nós temos que ter também mais seriedade com o agente penitenciário brasileiro”, reiterou Leandro Allan Vieira da Federação Brasileira dos Servidores Penitenciários.
Outras impressões de Paulo Malvezzi
Na avaliação de Paulo Cesar Malvezzi Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária, os posicionamentos dos participantes na audiência pública devem levar os parlamentares a repensar a aprovação do PLS 513/2011.
Para ele, foi positivo perceber que os agentes penitenciários também são contra a privatização dos presídios, assim como a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil e a Nova Central Sindical de Trabalhadores. Um avanço a ser feito é fazer com que organizações de familiares de presos e de egressos também tomem parte do debate.
Outro aspecto destacado por Paulo Malvezzi é o requerimento feito pelo senador Paulo Paim (PT-RS) ao plenário, pedindo que a matéria passe por outras comissões de análise, algo que teve parecer positivo já em 9 de março.
Fonte: Agência Senado
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