Acesse a nota na íntegra AQUI.
São Paulo, 07 de julho de 2020
Uma das medidas preventivas contra a COVID-19 que possui maior proximidade com o consenso científico diz respeito ao uso de máscaras. Diante de evidências clínicas – encontradas por variados institutos de pesquisa, como o Scripps Research Institute e a Nature Medicine – de que o vírus Sars-Cov-2 (Coronavírus) possui um tempo de incubação médio de 14 dias e de que ele pode ser transmitido por pacientes assintomáticos ou pré-sintomáticos, entidades especializadas em estudos epidemiológicos e profissionais da área orientaram, desde o início da pandemia, que o uso de máscara é primordial para minimizar a propagação do vírus na sociedade.
A FioCruz, por exemplo, recomendou que o uso de máscara “em larga escala tem como base a proteção coletiva, uma vez que muitas pessoas podem estar infectadas e serem assintomáticas”. A Agência Nacional de Saúde Suplementar reforçou que “os benefícios da utilização do equipamento são coletivos: ao usar a máscara, além de se proteger contra o vírus que pode estar circulando à sua volta, a pessoa impede a transmissão da Covid-19 aos demais, caso esteja com a doença e ainda não saiba”.
Em sentido diametralmente oposto, o Presidente Jair Bolsonaro, mais uma vez, contrariou o conhecimento científico. Na manhã do dia 6 de julho, por meio de uma ardilosa manobra no processo legislativo, o Governo Federal republicou a Lei nº 14.019/2020, vetando o art. 3º-F que enunciava ser “obrigatório o uso de máscaras de proteção individual nos estabelecimentos prisionais e nos estabelecimentos de cumprimento de medidas socioeducativas, observado o disposto no caput do art. 3º-B desta Lei”.
Como razão de veto, o presidente se escondeu na famigerada autonomia dos entes federados e na capitalista liberdade individual, eximindo-se deliberadamente de sua responsabilidade como Chefe de Estado e violando os direitos à vida e à saúde da população carcerária.
Nesse sentido, é perceptível o vício procedimental. No dia 3 de julho, a Lei 14.019/2020 – que altera a Lei nº 13.979/2020 e que dispõe sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras – foi publicada com a presença do art. 3º-F, comprovando sua sanção. Dias depois a lei foi republicada com veto ao art. 3º-F, violando, assim, normas constitucionais. Ou seja, após a aquiescência em tornar obrigatório o uso de máscara em prisões, Jair Bolsonaro regrediu e atacou a obrigação.
Esse comportamento presidencial explicita o projeto político genocida de crimeinfecção promovido pelo Estado. O objetivo é matar presos, presas, servidores e servidoras do sistema penitenciário. Sem a obrigação de uso de máscaras em ambientes prisionais, o governo aumenta o risco de infecção pandêmica e catalisa a produção – já elevada – de mortes por doenças respiratórias no cárcere.
Conduta semelhante que também materializa esse projeto foi adotada na mesma lei, pois além das prisões, o presidente vetou a obrigação do uso de máscaras em igrejas, comércios e escolas, demonstrando o descaso governamental com a saúde da população nacional, em especial da parcela excluída e marginalizada pelo capital.
Segundo a Escola Nacional de Saúde Pública, “em março, a Covid-19 contribuiu com 35% da taxa de óbito nos presídios, enquanto, em abril, ficou em 54%. Isso mostra uma tendência importante de aumento, uma vez que a taxa de mortalidade, excluindo a Covid-19, fica em torno de 20 a 25% por 100 mil”. A Covid-19, portanto, já demonstrou sua letalidade no âmbito carcerário. Com base nos dados enxutos e maquiados fornecidos pelo DEPEN, a enfermidade já matou 62 vidas.
Esse número está extremamente aquém da realidade, já que apenas 17.062 testes teriam sido realizados, o que representa apenas 2,28% da população carcerária. Cumpre ressaltar, ademais, que mortes estão sendo produzidas e camufladas pelo Estado sem a realização de diagnóstico causal conclusivo.
É nessa direção que o presidente (des)governa o país: instrumentalizando uma enfermidade letal para provocar cada vez mais mortes na população carcerária. Apesar da efetividade da máscara na redução de danos infecciosos no âmbito prisional, desencarcerar é a única solução.
Pastoral Carcerária Nacional
07/07/2020