Comissão Global recomenda descriminalização das drogas em todo mundo

 Em Agenda Nacional pelo Desencareramento

O relatório “Avançando a reforma da política de drogas: uma nova abordagem para a descriminalização”, lançado em 22 de novembro, nos Estados Unidos, pela Comissão Global de Política sobre Drogas, formada por estudiosos no tema e ex-chefes de Estado, recomenda que em todo mundo haja a descriminalização drogas para o bem da saúde pública e dos direitos humanos.
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O relatório apresenta como recomendações centrais a abolição de qualquer pena – em especial da pena de morte – para quem use ou esteja em posse de drogas ilícitas; graduação de punições aos envolvidos com as drogas, tendo em conta que muitos entram no narcotráfico por serem marginalizados pelo sistema econômico; a criação de um tratado internacional entre os países membros da ONU para remover qualquer penalização aos que tiverem em posse de drogas; e ainda que cada país desenvolva modelos de regulação a respeito do uso e comercialização das drogas hoje consideradas ilícitas.
Segundo Ruth Dreifuss, presidente da Comissão Global, o principal problema de saúde pública relacionado às drogas é a criminalização dos usuários. No documento, são detalhados os danos causados aos direitos humanos e à saúde pública devido a essa criminalização e citados casos de sucesso onde a descriminalização das drogas teve respaldo de políticas de serviços sociais e de redução de danos aos usuários.
Segundo Michel Kazatchkine, ex-diretor executivo do Fundo Global de combate à Aids, tuberculose e malária, “mais drogas estão disponíveis, novas drogas mais baratas cada semana vêm no mercado, e mais drogas são usadas. A proibição criou um enorme mercado ilegal de várias centenas de bilhões de dólares que ameaça a estabilidade e alimenta a corrupção e a violência. A criminalização está levando todos os dias em todas as partes do mundo a violações dos direitos humanos: assassinatos sancionados pelo Estado nas Filipinas; A pena de morte ou a centros de detenção na Ásia”.
O impacto na saúde pública também tem sido severo. Dos usuários de drogas injetáveis ​​do mundo, ele destacou que “um em cada cinco está infectado com o HIV; Dois em cada três com hepatite”, e complementou: “As leis criminais, forçando os usuários de drogas em práticas inseguras e impedindo a implementação de medidas de redução de danos que salvam vidas, são em grande parte responsáveis por isso”.
Nos Estados Unidos, segundo Kazatchkine, “a criminalização levou a uma onda de excesso de encarceramento”. Ele observou que 1,5 milhão de prisões relacionadas a drogas naquele país, em 2015, 83% eram por simples posse de drogas e que um registro criminal dessa situação estigmatiza a pessoa conseguir um emprego e mudar de vida. “E em toda parte, as minorias étnicas e as pessoas economicamente vulneráveis ​​na sociedade são presas de forma desproporcional”.
O relatório também destaca que em todo mundo milhões de pessoas usam drogas sem prejudicar as outras e que o atual nível criminalização é desproporcional e prejudica o direito à privacidade e o direito à dignidade e à autonomia pessoal.
Pavel Bém, ex-prefeito de Praga, na República Tcheca, citou o exemplo de Portugal, que despenalizou todas as drogas em 2001. “Em 15 anos, os incidentes de novos casos de HIV caíram 91% – isso é fenomenal. Havia 80% de poupança em custos sociais – em parte por pessoas que não perdem empregos por ser enviado para a cadeia”.
Ele enfatizou que “o impacto econômico da despenalização é enorme”, mas que ainda mais importante é o impacto na área da saúde. “Olhando para as evidências científicas, não há argumento para manter políticas punitivas de drogas”. Porém, ele advertiu: “A descriminalização por si só não é suficiente; Deve ser acompanhada por medidas sociais e de saúde pública e de redução de danos”.
Impacto na lei de drogas na superlotação carcerária
De acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas 2016, do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), 18% da população carcerária do mundo é composta de pessoas condenadas por crimes relacionados a drogas, sendo muitas delas oriundas de setores marginalizados da população. O encarceramento em massa de pessoas que cometem delitos ligados a drogas levou à superlotação de prisões em países de todo o mundo, com condições que são extremamente prejudiciais à saúde e ao bem-estar dos presos.
Há muitas provas de que as leis de drogas levam ao encarceramento massivo. O relatório “Avançando a reforma da política de drogas: uma nova abordagem para a descriminalização”, destaca que no Brasil a população carcerária cresceu exponencialmente desde a virada do século XXI, após mudanças nas leis nacionais sobre drogas terem levado a um aumento de 62% das detenções por delitos envolvendo drogas, entre 2007 e 2010. Em 2014, o nível de ocupação prisional era de 157%. Igualmente, o medo do aumento do consumo de metanfetamina na Tailândia levou o governo a reprimir os usuários, causando a prisão de quase 196 mil pessoas em 2012. Hoje, as prisões tailandesas estão superlotadas em nível alarmante, com ocupação em 144% de sua capacidade oficial; 70% dos detentos cumprem pena por crimes relacionados a drogas.
Nos Estados Unidos, o encarceramento em massa provocado pelas leis sobre drogas – inclusive a que obriga a um período mínimo de sentença em casos de delitos menos graves – tem tido um impacto devastador sobre minorias raciais: embora os negros representem 13% da população norte-americana, eles são quase 40% dos detentos nos níveis estadual e federal por delitos ligados a drogas. Enquanto isso, a comunidade latina, que responde por 17% da população, constitui 38% dos detidos em prisões federais por delitos ligados a drogas.
Igualmente devastador é o impacto da criminalização sobre as mulheres. Estatísticas de sistemas prisionais revelam que a porcentagem de encarceradas por crimes relacionados a drogas supera a de homens. Em partes da América Latina e do Sudeste Asiático, mais de 70% das mulheres presas foram condenadas por delitos de drogas, incluindo o porte.
O encarceramento de mulheres que cometem infrações menores ligadas a drogas pode ter um profundo impacto negativo sobre a família, em especial sobre os filhos. Além disso, em todo o mundo, mães e gestantes que usam drogas têm medo de procurar ajuda ou de acessar serviços de tratamento ou redução de danos devido ao risco de perder a guarda dos filhos.
Pastoral Carcerária é favorável à descriminalização das drogas
Após mais esse relatório internacional sobre os prejuízos da criminalização das drogas, com especial impacto no encarceramento em massa, a Pastoral Carcerária reforça que é favorável à descriminalização das drogas, como consta na Agenda Nacional pelo Desencarceramento:
“A política de ‘guerra às drogas’ traz impactos imensos ao sistema carcerário e é determinante na construção de carreiras criminalizadas entre jovens pobres das periferias. O número de pessoas presas por tráfico mais do que triplicou entre 2005 e 2011, passando de 31.520 para 115.287. O modelo atual (cujo marco legal é a Lei 11.343/2006), além de, obviamente, não atingir o objetivo de evitar a utilização de entorpecentes, agrava o problema, eis que as pessoas presas sob acusação de tráfico são, em regra, aquelas que estão na base da hierarquia do comércio de entorpecentes: pessoas pobres (geralmente primárias), residentes na periferia, que não raras vezes traficam para sustentar o próprio vício… A política de combate às drogas é ainda mais cruel quando se trata das mulheres: mais do que a metade da população prisional feminina é composta de mulheres acusadas por crime de tráfico de drogas. Já passa do tempo de romper com a deletéria guerra estadunidense contra as drogas (e, por via oblíqua, contra os periféricos) e elevar o enfrentamento aos efeitos nocivos do uso de entorpecentes ao patamar de política de saúde e de educação públicas”.
Fonte: The Global Commission on Drug Policy

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