Reproduzimos a seguir, a poesia “Um desabafo para Cuité”, escrita pelo poeta Edgar Medeiros da Fonseca, que se encontra encarcerado na cadeia pública de Cuité, na Paraíba.
Um desabafo para Cuité
Carrego no peito um trauma
De uma vida apedrejada
Como escudo tenho Deus
Que ilumina minha alma
Deus é quem me fortalece
Como Pai não me esquece
Nessa longa caminhada
O sonho da minha vida
É um dia sentir paz
Um futuro de alegria
Esquecer tudo pra traz
Peço a Jesus com abundância
Que me faça essa aliança
Em Teu nome e do Teu Pai
Gostaria que Cuité
Lesse o meu coração
Deixe o passado de lado
Quero ser um cidadão
Dependo só de vocês
Esquecer que um dia errei
A todos peço perdão
Sei que estou deixando o mundo
Um mundo de traição
Um mundo de covardia
Um mundo de ambição
Um mundo de vaidade
Por isso não levo saudade
Desse mundo de ilusão
Aqui só vale quem tem
Quem não tem não vale nada
Quem tem errado tá certo
Quem não tem certo é errado
Tudo aqui é diferente
Não sabe que lá na frente
Um dia vão ser julgado
Na cidade onde nasci
Conheço o procedimento
Por onde eu andei também
É o mesmo movimento
Corrupção é geral
É um país sem moral
Sem respeito e sentimento
Não posso bater de frente
Mas deixo a verdade escrita
Meu sentimento é profundo
Estou cansado, não minto
Tenho cinquenta e três anos
Sem meus pais só desengano
Da vida perdi o brilho
Eu reconheço meus erros
Mas não me julgo bandido
Pra tantas perseguições
Para o que fazem comigo
Os abusos de poder
Que querendo ou sem querer
Me odeiam tão perseguido
Meus erros nessa cidade
Todos têm conhecimento
Nunca estuprei nem roubei
Me orgulho e argumento
Porque me fazem bandido
Pra justiça o escolhido
Ser dono do sofrimento
Não fui o primeiro a errar
Nem matar fui o primeiro
Ninguém mata sem motivo
Mas tem que ter o dinheiro
Quem não tem vira bandido
Da justiça perseguido
Fechado no cativeiro
Quem tem dinheiro não sofre
Mata até covardemente
Na cadeia tem apoio
Cumpre pena como agente
A vítima vira o réu
A justiça dá o troféu
Lhe chamando de inocente.
A verdade sempre dói
Mas não posso esconder
Sou vítima desses abusos
Ninguém ganha do poder
Eu levo a vida sofrendo
Deus é prova, Ele tá vendo
É alguém que faz vencer
Sempre respeitei Cuité
Meus casos foram isolados
Não foi com a sociedade
Era um cabra safado
Afirmo de antemão
Essa vida de ladrão
Não foi esse o meu passado
Não sou contra a justiça
Sou contra a perseguição
Dá a uns os seus direitos
Outros negam sem razão
São dois pesos, duas medidas
Prato em baixo, outro em cima
Fazendo corrupção.
Eu queria que a justiça
Fizesse o que a lei manda
Cobrar da calúnia a prova
Toda tese desumana
Mas passa despercebido
Ofendendo o dirigido
Destruindo a vida humana.
A calúnia é coisa séria
Crime constitucional
Cometido claramente
Como que seja banal
Sou vítima da delinquência
Reincidido com frequência
Vou esclarecer em jornal
É um crime conhecido
Que fica na impunidade
A justiça fecha os olhos
Foge da realidade
Fazendo o crime crescer
Ninguém consegue esquecer
Da calúnia e falsidade
Não sabe o trauma que deixa
Se soubesse não faria
A mágoa fica no peito
O pior: a agonia
Saiba senhora e Senhor
Se fosse em ti essa dor
Não pensava em covardia.
A minha história em Cuité
É feita sem formação
De um risco fazem um livro
Cheio de perseguição
São de falsos criadores
Das calunias professores
Ausente de punição
Da injustiça eu falei
Na família vou falar
A justiça me faz rir
A família me faz corar
Sempre amei de coração
Hoje não vejo um irmão
Que possa me ajudar
Sempre amei primo e cunhado
Sobrinho, tio e irmão
Meu pai pra mim era tudo
Mamãe a minha paixão
Meus filhos refugiados
Não sou ninguém desprezado
Mas não encontro razão.
Mesmo assim, deixo um abraço
Pra Édson e Edivaldo
Ernandes, Eudes e Everton
Alexandre e Everaldo
Se na vida eu errei
O desprezo de vocês
Me deixou mais revoltado.
A todos peço perdão
Se na vida fui errado
Hoje sou arrependido
Mas não se volta ao passado
Mas eu só errei na terra
Me atire a primeira pedra
Quem aqui não tem pecado.
Eu vou parar por aqui
Me sinto muito oprimido
A resposta Deus quem dá
Ele não vive dormindo
Eu nasci pra ser irmão
Mas se vocês não são
Desculpe eu está sentido.
A minha maior revolta
É o povo me caluniar
Já tentei um suicídio
Em outro penso tentar
Quem sabe a motivação
Deus dará o seu perdão
E com Ele vou morar.
Não sei se é despedida
Tudo que estou escrevendo
Nada seja novidade
Por tudo que estou sofrendo
Os demais guardo em segredo
Em divulgar tenho medo
Vou deixar no pensamento.
Apesar dos meus problemas
Sempre respeitei Cuité
Crianças, moças, rapaz
E também toda mulher
Só quero uma vida nova
Eu tenho um homem de prova
É Jesus de Nazaré.
A minha história é longa
Vocês conhecem de perto
Só não existe motivo
Para tanto desafeto
Vivo cheio de desgosto
As lágrimas molhando o rosto
Sem carinho, sem afeto.
Não posso divulgar tudo
Que no peito guardado
Só pretendo ser feliz
Apagar todo passado
Viver feliz com alguém
Me sentir homem de bem
Pra amar e ser amado.
Vou ser digno e sincero
Neste poema final
Se eu pensava em vingança
Joguei pra fora todo mal
Antes eu era sozinho
Hoje eu tenho Deus no Caminho
Agradeço a Pastoral.
Um desabafo para Cuité
O Poeta
Edgar Medeiros da Fonseca
08- 01-2016