Em sua última reunião no ano de 2013, em 7 de dezembro, a coordenação da Pastoral Carcerária da Arquidiocese de São Paulo aprovou o nome do filósofo Marcelo Naves, como novo vice-coordenador arquidiocesano da Pastoral.
Padre Valdir João Silveira, que também é coordenador nacional, segue coordenando a PCr na Arquidiocese, tendo por secretário Deyvid Livrini, e como coordenadores nas regiões episcopais: Eliana Rocha (Região Santana), padre Eugenio Luiz de Barros (Região Sé), Laudenice Pedreira Rocha (Região Brasilândia) e Nicomedes José Vieira (Região Belém).
Nesta entrevista ao site da PCr Nacional, Marcelo Naves conta seu história de atuação pastoral, desde 2000 com a Pastoral da Juventude, comenta como essa experiência poderá auxiliá-lo na Pastoral Carcerária e avalia que seus principais desafios, junto aos companheiros da PCr, serão combater as estruturas e a mentalidade punitiva e vingativa que vigora na sociedade, enfrentar o encarceramento em massa e buscar a democratização efetiva do sistema judiciário.
Site PCr Nacional – Marcelo, conte um pouco de sua trajetória pastoral
Marcelo Naves – Quando eu tinha 17 anos, em 2000, comecei a participar da Pastoral da Juventude, no Setor Medeiros, da Região Santana. No final do mesmo ano, estive no Encontro Nacional de Fé e Política, em Santo André. Essa atividade e os primeiros encontros da Pastoral da Juventude (PJ) que participei foram decisivos para meu engajamento, especialmente pelos fortes momentos de mística, pela profunda espiritualidade – profética, encarnada e libertadora –, e pelo envolvimento e compromisso com a vida dos pobres. Participei do grupo de base da PJ na Paróquia Santa Zita, no Setor Medeiros, e fiz parte da coordenação da PJ da Arquidiocese de São Paulo, sendo coordenador entre 2005 e 2007, e também da coordenação da PJ do Regional Sul 1 da CNBB, entre 2004 e 2007, representando, ainda, a PJ no Fórum das Pastorais Sociais. Nesse período, a PJ mergulhou no debate e na militância por políticas públicas para a juventude e desenvolveu grandes campanhas pela vida das juventudes, destacadamente na luta contra a redução da maioridade penal. Continuo militando junto às questões das juventudes pelo Instituto Paulista de Juventude (IPJ), que completou, em 2013, 10 anos de atividades.
Site PCr Nacional – Com tantas atividades ainda sobrou tempo para fazer faculdade e outros estudos complementares?
Marcelo Naves – Junto com tudo isso, cursei filosofia na PUC-SP, concluindo o bacharelado e a licenciatura em 2005, mesmo ano em que comecei a lecionar na rede pública do Estado de São Paulo, onde trabalho até hoje nas turmas de ensino médio. Atualmente, curso História na Unifesp (campus Guarulhos). Em 2008 e 2009, fiz um curso de pós-graduação Lato Sensu pela FAJE de Belo Horizonte, organizado pela Rede Brasileira de Centros e Institutos de Juventude, onde procurei discutir os processos de formação da subjetividade de jovens em situação de violência. Desde 2010, participo da Pastoral Fé e Política na paróquia Santa Zita, onde procuramos intervir de realidade local e nas questões mais conjunturais.
Site da PCr Nacional – Esse histórico de atuação com a juventude, especialmente na PJ, vai ajudá-lo em que aspectos nesta nova atribuição na Pastoral Carcerária?
Marcelo Naves – Acho que a experiência de PJ traz contribuições enormes para o trabalho na PCr. É difícil enumerá-las. Seria uma lista enorme! Desde a metodologia de trabalho de formação até a vivência da mística e da espiritualidade. Mas eu penso que um grande desafio que está posto é o trabalho com as juventudes que se encontram no cárcere e/ou que passaram por ele. Até porque são muitos os presos e as presas e os egressos e as egressas entre 18 e 29 anos. Essas pessoas buscam suas identidades em detrimento dos estigmas que recebem a todo o momento: tentam vislumbrar perspectivas e esperanças em meio a estruturas sociais que lhes castram os sonhos. A PJ tem larga experiência e acúmulo em práticas, em que os jovens são protagonistas e experimentam vivências comunitárias. Com certeza, essa metodologia contribuirá muito nos trabalhos na PCr.
Site PCr – Com quais perspectivas você assume a vice-coordenação da PCr da Arquidiocese de São Paulo? O que pode ser melhorado no trabalho que vem sendo desenvolvido?
Marcelo Naves – A perspectiva é a de uma tríade: comunhão, serviço e compromisso com a dignidade humana, que justamente caracterizam a PCr de São Paulo e a caminhada dos agentes e das agentes pastorais. O momento é sempre o de “avançar para águas mais profundas”. Acho que a reunião de planejamento da PCr, em dezembro, deu grandes encaminhamentos no âmbito da formação dos agentes pastorais e na comunicação da PCr. É bom lembrar que temos um ótimo material para a formação cristã no cárcere, que foi muito bem avaliado pelos agentes pastorais. Parece-me, porém, que o desafio é muito grande no sentido do combate às estruturas e à mentalidade punitiva e vingativa, e isso em todos os setores da sociedade, sem exceção. Nesse sentido, penso que é importante a PCr contribuir ainda mais no aprofundamento e expansão de práticas de justiça restaurativa, assim como no combate ao encarceramento em massa e na democratização e efetivo acesso ao sistema judiciário.
Site PCr – Uma última pergunta: o que lhe atraiu para a participar da Pastoral Carcerária?
Marcelo Naves – Estou na PCr, efetivamente, desde fins de 2011 e começo de 2012. Mas a minha aproximação com a PCr foi em 2006. Naquele ano, decorrente dos “Crimes de Maio”, as Pastorais Sociais da Arquidiocese de São Paulo, juntamente com inúmeras entidades e movimentos sociais, organizaram o Fórum pela Paz. Os homicídios em São Paulo estavam em patamares alarmantes, vitimando especialmente jovens. Foi nesse Fórum que tive contato com o padre Valdir João Silveira e o padre Gunther Zgubic [coordenador nacional honorífico]. Padre Valdir destacava que a juventude não era apenas vítima dos homicídios, mas também do aumento do encarceramento. Essa contraposição entre a luta que a PJ vinha travando por políticas públicas para a juventude e uma conjuntura de encarceramento e extermínio de jovens chamou muito a minha atenção. Em 2009 e início de 2010, juntamente com outros pejoteiros e pejoteiras, fiz parte de um grupo que teve como foco estudar essa realidade, procurando subsidiar a PJ sobre tal tema. O saudoso irmão e companheiro Pedro Yamaguchi era o elo com a PCr. Esse contexto permanece crítico. Atuar e transformar de forma profética essa realidade são um imperativo para a PCr. Compartilho com esse horizonte. Atuando juntamente com todos os membros da Pastoral, especialmente os mais próximos nas visitas no cárcere, padre Eugênio e Rodolfo Valente. Comungamos dessa esperança e desse espírito missionário.