Metade dos presos de SP é reincidente, indica estudo feito por José de Jesus Filho

 Em Notícias

Jose_Filho_CapaUm em cada dois presos em São Paulo é reincidente no sistema carcerário, ou seja, possuía pelo menos uma condenação anterior ao atual cumprimento de pena. É o que indica o relatório “Crime, Segurança Pública e Desempenho Institucional em São Paulo”, apresentado por José de Jesus Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional, em 24 de março, durante o evento “Trajetórias de vida e justiça criminal da América Latina”, promovido, em São Paulo, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
José, que também é doutorando em administração pública e governo da FGV, coordenou o relatório no Brasil, que é parte de um projeto de pesquisa internacional chamado Populações Carcerárias na América Latina, também desenvolvido na Argentina, Peru, México, El Salvador e Chile. O percentual de reincidência verificado em São Paulo só é inferior ao do Chile, país em que 52,9% dos atuais detentos já foram presos anteriormente.
O relatório, feito com base no perfil de 751 presos de dez unidades prisionais paulistas, indica que 40% foram presos por roubo, e há significativos percentuais de encarceramento por tráfico de drogas (30%), crimes sexuais (16%) e homicídio (11%). No caso de tráfico de drogas e porte de armas, a maioria dos crimes foi cometida por mulheres (66% dos casos).
“Prendemos as pessoas erradas, e prendemos mal. Prendemos pessoas que cometeram crime contra o patrimônio ou tráfico no varejo e deixamos os crimes de colarinho branco ou os grandes gerentes do tráfico de fora. Eles não são presos porque não há investigação. Só prendemos quem está cometendo o crime no ato. Aquele que planeja e aquele que supervisiona o crime dificilmente são presos. O que precisamos rever é justamente isso: nosso sistema de Justiça não funciona adequadamente”, afirmou José de Jesus Filho.
A maior parte das detenções feitas em São Paulo ocorreu em flagrante (dois em cada três casos). No caso de assassinato, em 43% do total de prisões, os autores foram presos no mesmo dia. Já em relação aos presos por conta de drogas, geralmente, segundo o estudo, são encarcerados os pequenos traficantes ou usuários.
Conforme o relatório, a maior parte dos presos é jovem e tem entre 25 e 29 anos. Quase a totalidade deles é homem (cerca de 5% são mulheres). Sete em cada dez entrevistados têm filhos e 30% deles não trabalhavam antes de ser presos. A maioria dos detentos, 83,7%, não concluiu o ensino médio. Além disso, um em cada quatro presos, fugiu de casa antes dos 15 anos, e destes, 33,5% tomaram tal atitude em decorrência de terem sofrido violência familiar.
“Infere-se que as condições familiares e os lares onde cresceram os condenados são de negligência e marginalidade. São cada vez maiores os índices de violência, de consumo de drogas e de álcool, de abandono, de desistência escolar, de ingresso precoce na economia informal”, aponta um dos trechos do relatório.
Na avaliação do assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional, os dados do relatório apontam que as políticas públicas, quando existentes, não são suficientes. “Significa dizer que as políticas de desencarceramento e as políticas de prevenção ao retorno à prisão não estão funcionando”, disse. “Deveríamos criar políticas sociais com maior investimento na prevenção, principalmente nas famílias, e alternativas penais”, acrescentou.
Esse cenário encontrado em São Paulo, de acordo com o pesquisador, pode ser ainda pior em todo o Brasil, uma vez que pesquisa somente analisou as condições carcerárias paulistas. “No Brasil, os índices se agravariam muito mais. São Paulo, que é o estado economicamente mais desenvolvido do país, já apresenta índices piores do que boa parte dos países da América Latina”, afirmou José de Jesus Filho.

Análise de outros participantes do evento
Para a doutora em sociologia e professora Camila Caldeira Nunes Dias, o estudo revela que a violência recai sempre sobre alguns grupos sociais. “Isso não ocorre porque há alguns grupos da população que são mais propensos a cometer crimes. Isso ocorre porque a ação policial, a ação repressiva do Estado e a criminalização da conduta recai sobre alguns grupos sociais. E a prisão – e também o adolescente quando é internado – é reprodutora das condições de vulnerabilidade desses grupos populacionais. É um círculo vicioso de reprodução: quando o chefe de família passa 15 anos na cadeia, isso deixa seus filhos vulneráveis”.
Segundo Augusto Rossini, diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, a maior parte dos presos no Brasil, 70%, é detida por crimes contra o patrimônio ou tráfico de drogas. Um dos grandes problemas do sistema prisional brasileiro, segundo analisou, é o fato de que 40% dos detidos serem presos provisórios, ou seja, sem condenação. “Como se vai formular políticas se não há certeza de quanto de pena ele [detido] vai cumprir?”. Ainda de acordo com Rossini, no Brasil, cerca de 80 mil pessoas estão presas por furto e 170 mil por tráfico. “É preciso repensar o nosso modelo prisional. As penas alternativas precisam ser, de fato, aplicadas”.
Na avaliação de Mauro Rogério Bittencourt, coordenador de Reintegração Social e Cidadania da Secretaria de Administração Penitenciária (SP), “quando se fala em um índice de 50% de reincidência, isso não é culpa exclusiva do sistema prisional, que não está conseguindo reintegrar estas pessoas. A culpa é desde a infância, quando essa pessoa não teve uma série de serviços, até o momento em que ela foi presa. E a sociedade tem que começar a perceber que esta pessoa está presa e vai voltar, não vai ficar mais de 30 anos presa. E quando ela volta, ela volta porque cumpriu a pena, porque ela tem uma decisão judicial que fala que ela já pode viver em sociedade. Se a sociedade não perceber que ela tem que abrir as portas para essas pessoas e não der oportunidades para elas poderem se reintegrar, elas vão voltar [ao crime]. E quem paga isso? É a própria sociedade, que paga não só o custo financeiro, quanto o custo social, porque para cada um dos 50% que voltaram para a prisão, foi cometido um delito”.
Convidados para o evento promovido pela FGV, os secretários de Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, e de Administração Penitenciária, Lourival Gomes, não compareceram, somente enviaram representantes.

Fontes: Agência Brasil e Portal Terra

DEIXE UM COMENTÁRIO

Volatr ao topo