A Pastoral Carcerária Nacional vem a público se solidarizar com Dom Orlando Brandes, arcebispo de Aparecida (SP), e a CNBB, alvos de recentes ataques por se posicionarem pela defesa da da vida humana e da democracia.
Em missa, D. Orlando fez um discurso contra o armamento da população, afirmando que “para ser pátria amada não pode ser pátria armada”. Ele também fez um alerta sobre o discurso de ódio crescente na sociedade e a difusão de notícias falsas.
O sermão provocou a ira do setor conservador da sociedade, tendo como seu ápice discurso inflamado do deputado estadual Frederico D’Avila (PSL), na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), no qual desrespeitou o bispo, chamando-o de “vagabundo” e “safado”; ofensas ao Papa Francisco e à CNBB também foram proferidas.
Em nota, a CNBB repudiou as falas do deputado, que, após a repercussão negativa de seu discurso, prontamente se retratou. No entanto, o conselho de ética da Alesp irá analisar as ofensas por ele ditas.
A Pastoral Carcerária, que lida diariamente com a população marginalizada e excluída por trás das grades, não pode deixar de ver uma reação de uma magnitude tão violenta como a representação simbólica do discurso de ódio na sociedade, discurso esse que também é responsável por desumanizar a população presa, legitimando as muitas torturas e violações de direitos que ocorrem no cárcere.
As prisões não tem como função diminuir ou acabar com a violência. O Brasil é o terceiro país que mais encarcera no mundo, se esse fosse o caso, não haveria violência. Pelo contrário, a prisão só aumenta a violência. E, da mesma forma, não há um cenário no qual o porte de armas diminui a violência.
Pelo contrário, a ampliação do armamento representa o aumento imediato do arsenal bélico do Estado e dos demais detentores do poder na sociedade, potencializando os casos de violência armada da classe privilegiada contra a parcela marginalizada da sociedade. O fácil acesso à arma impacta diretamente na ampliação da violência do opressor contra o povo oprimido.
Há diversos projetos de lei que visam autorizar o porte de armas para os agentes penitenciários, sendo o mais recente de junho deste ano, assim como o PL 9432/2017 visa dar uma “licença para matar” aos policiais militares.
Essas propostas não estão dissociadas da militarização crescente no cárcere, pois as prisões são o laboratório por onde a barbárie surge e cresce. É no cárcere que o Estado testa e experimenta novas formas de domínio sobre o corpo do “inimigo”, novas táticas de assujeitamento e novas formas de aterrorizar e produzir dor nas pessoas marginalizadas.
O controle e formas torturantes de tratar os presos se torna cada vez mais cotidiano. Prova maior disso é a FTIP (Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária), que, por todos os presídios que passa, exacerba a violência – as marcas registradas da FTIP são a quebra dos dedos dos presos e o rigoroso regime de silêncio, que, se desrespeitado, gera todo tipo de punições violentas.
É dever de todo cristão que se preocupa com a vida humana denunciar propostas e movimentações que colocam esta em risco.
A perseguição e o escárnio aos que defendem os oprimidos e lutam por uma sociedade igualitária sempre existiu e sempre vai existir; a maior prova disso é nosso senhor Jesus Cristo, que foi condenado à morte justamente por estar ao lado dos mais vulneráveis.
Mas da mesma forma que ele venceu e superou a morte com a ressurreição, não podemos perder a esperança e a vontade de lutar: a nossa missão de fé, por um mundo sem cárceres, e por um mundo sem armas, continua.
Pastoral Carcerária Nacional
20/10/2021