Os relatos e histórias dos romeiros da PCr em Aparecida

 Em Igreja em Saída, Notícias

Por Isabela Menedim

Nos dias 27 e 28 de agosto, cerca de 500 romeiros, dentre eles agentes pastorais, familiares e sobreviventes do cárcere, se encontraram em Aparecida para a comemoração dos 50 anos da Pastoral Carcerária. 

Durante a celebração, os romeiros e romeiras concederam algumas entrevistas, contando como conheceram a pastoral, relembraram histórias marcantes e também mandaram mensagens incentivando futuros agentes a fazer parte da missão pelo desencarceramento. 

Adão Veigas Junior, sobrevivente do cárcere de Rio Negro (PR), conheceu a pastoral enquanto ainda estava dentro do presídio, e contou que estar ali, como um agente da PCr e poder ajudar os que ainda estão encarcerados, era um momento histórico na vida dele.

Ele ressalta a importância das visitas da pastoral e manda uma mensagem para os agentes: “Quem está preso às vezes é abandonado até pela família, não tem visita, e com a PCr você tem essa família, esse apoio, e consegue ter uma esperança de vida. Aos agentes da pastoral peço que continuem ajudando, levando a palavra de Deus, e que sejam Jesus na terra, porque ele ensinou que nós devemos ajudar os necessitados”.  

Agente da PCr há 19 anos, Anildo Dall Astra, de Chapecó, conta sua história de ingressão em um relato emocionante: “eu era alcoólatra, e a pessoa que me procurou sabia que eu era ministro da igreja católica e que eu estava passando por uma situação difícil, então ele pensou que se me colocasse em compromisso, eu sairia do alcoolismo. Ele conseguiu me transformar, e hoje eu digo tenho muitos filhos do cárcere, que quando me encontram na rua, vêm dar aquele abraço e agradecem pelo testemunho que os fez mudar de vida. Acredito que isso tenha feito mais bem para mim do que para eles”.

Anildo relembra uma visita marcante para ele, onde foi chamado pelo diretor do presídio para conversar com um homem que estava tendo comportamento agressivo. “Eu era impedido de me aproximar dele, mas não de rezar por ele”.

Depois de três horas de oração, o homem estava ajoelhado e tentava abraçá-lo pelas grades. Atualmente já está em semi-liberdade. “O homem que precisava ter corrente nos pés e nos braços hoje está sendo um pai de família”. 

Ele finaliza com uma mensagem inspiradora: “Sem o esforço da busca, é impossível a alegria do encontro. Não existem troféus para quem desiste na metade do caminho, não importa chegar em primeiro, o que importa é você caminhar. Não queira fazer grandes chuvas, uma garoa contínua vale mais que uma enxurrada”.

Maria da Conceição, de Boa Vista, Roraima, é coordenadora da Pastoral Carcerária há 10 anos, e conta que desde pequena visitava os presídios de Teresina com seu pai, e anos mais tarde conheceu o trabalho da PCr e se apaixonou.

Ela relata um momento que a marcou de forma negativa durante uma tentativa de visita na cadeia pública de Boa Vista, onde foi pedido para que ela tirasse a roupa para a revista vexatória, uma prática humilhante que a PCr luta para ser abolida. 

Conceição diz que não confiaram nela por ser mulher e negra, e então optou por não fazer a visita. Depois do ocorrido, foi atrás dos direitos e fez a devida denúncia. “A gente procura engajar os familiares nessa luta de denunciar, mas eles têm medo, porque a represália é muito grande e eles são ameaçados”. A mensagem que deixou para futuros agentes é que sintam o amor; que amem as pessoas que estão encarceradas, sem julgamentos, porque elas precisam de ajuda. 

Lucas Duarte, coordenador da PCr em Curitiba e vice-coordenador do Regional Sul II do Paraná, entrou para a Pastoral em 2013. Ele defende que a tarefa que tem como coordenador é de articular e garantir a presença dos agentes nas unidades prisionais, e fazer com que a igreja esteja presente no cárcere. Ao mesmo tempo, a igreja deve assumir a realidade do cárcere para além das celebrações litúrgicas, e fazer o debate sobre o encarceramento presente no seu cotidiano.

“A gente precisa entender o desencarceramento como desencarcerar nossas mentes, estamos muito presos à ideia de pena e prisão. O desencarceramento fala sobre dar vida às nossas comunidades, que a gente consiga lidar com nossos conflitos sem recorrer à polícia e a prisão”.

Lucas ainda relata que quando ingressou na pastoral não acreditava no desencarceramento, mas mudou de opinião depois de uma visita: “quando pisei na cadeia eu percebi que aquilo não era de Deus, e se for não é do meu. Um Deus que prende nossos jovens não pode ser o Deus de Jesus Cristo”.

Edna Lima, que atua em São Miguel Paulista e Franco da Rocha, principalmente na questão da mulher encarcerada, relata que no início as mulheres não recebiam absorventes e kits básicos de higiene, mas com a luta da pastoral eles começaram a ser fornecidos. Ela visitava os hospitais penitenciários e passava um tempo na ala de mães, onde disse ter visto muitas delas terem que entregar os seus filhos. Outro evento marcante para ela foi a questão da pena de multa. 

“Eu acompanhei uma menina, e quando ela saiu eu fui visitá-la na casa dela, ela morava em um barraco de madeira em cima do esgoto, e tinha uma multa de três mil reais. Ela teve que parcelar a multa em sessenta vezes”. Emocionada, ela diz ter pensado em desistir de fazer parte da PCr. “A gente fica cansado, se sente mal em ver as situações de abandono e miséria”, mas com os relatos de todos que já ajudou, lhe dizendo a importância que teve na vida deles, ela tirou forças para continuar na missão.

Para Cremilda Gonçalves, de Niterói, Jesus não chama os capacitados, mas capacita os escolhidos. Ela incentiva que as pessoas busquem conhecer e se informar sobre os movimentos da igreja, pois “todos são importantes, mas a PCr é diferente, ela precisa muito mais, porque ela não dá ibope, ela não dá cartaz”. 

Maria Dolores, também de Niterói, reforça que o sentimento dominante ao entrar no presídio é o de amor. Não há curiosidade sobre os motivos daquelas pessoas estarem presas, para elas interessa estar junto e levar a presença de Deus para cada um deles. “A gente sente um amor tão grande que o peito chega a doer, é como se estivéssemos vendo nossos filhos e netos sofrendo ali”. 

Cremilda declara que as pessoas julgam de forma generalizada, que os presos são miseráveis e condenados que tomaram atitudes que vão contra seus princípios, mas defende que às vezes alguém esqueceu de falar sobre o amor de Deus para eles, e aquelas foram as consequências. 

“Eu digo sempre para eles que poderia ser ao contrário, poderia ser eu presa e eles no meu lugar, nenhum de nós está isento de um dia estar atrás das grades. Nosso Deus foi preso, os santos foram presos, porque eles seriam os piores?”.

 

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