Por Gianfranco Graziola
Franzino, com um sorriso desarmante e a gentileza típica dos povos asiáticos. Foram essas as primeiras impressões que tive no ano 2000 ao encontrar François Xavier Nguyen Van Thuân, na abadia Trapista das “Tre Fontane” em Roma, conhecida como lugar do martírio de Paulo.
Van Thuân nasceu no dia 17 de abril de 1928, numa família que conta numerosos mártires da fé. Sua mãe, todas as noites, contava-lhe histórias bíblicas e narrava-lhe testemunhos de mártires, especialmente de seus antepassados. Foi ordenado sacerdote em 11 de junho de 1953. Formado em Direito Canônico, em Roma, retorna ao Vietnã e é nomeado professor e reitor do seminário.
Em 1967, é nomeado como Bispo da diocese de Nha Trang, e escolhe como lema de sua nova missão as palavras conciliares «Gaudium et Spes» [alegria e esperança]. Em abril de 1975 é noemado arcebispo coadjutor de Saigon, logo após um encontro com o Papa Paulo VI. Parecia a realização de sonho, que no entanto durou apenas uma semana.
“No dia 15 de agosto de 1975, solenidade da Assunção de Nossa Senhora, festividade importante para o povo cristão, fui convocado ao palácio presidencial com um pretexto qualquer e sem saber que essa teria sido a última vez que iria viver como pessoa livre em minha pátria. Após um interrogatório que foi uma farsa, fui acusado de ser espião a serviço dos governos estrangeiros e logo levado sob escolta militar até o vilarejo de Cay Vông, distante dez quilômetros, onde fiquei em prisão domiciliar até 19 de março de 1976. Neste tempo em que não pude me comunicar com o exterior não desanimei, pensei em escrever nos versos de um antigo calendário alguns breves pensamentos que um menino de nome Quang, que me visitava diariamente, levava para as irmãs, que os multiplicavam e distribuíam entre o povo”, conta van Thuân.
A sua Via Sacra, no entanto, estava ainda no começo. Em 19 de março de 1976, dia da festa de São José, ele é transferido para a prisão de Phú Khánh e colocado numa cela de dois metros quadrados, sem janelas e sem ar.
“Por meses e meses fiquei confinado sem ver e falar com ninguém, com o intento de me levar à loucura. No mês de novembro fui novamente transferido para uma prisão no norte do Vietnã, entre as montanhas. Apesar disso não perdi a esperança. Privado de tudo e até da Palavra de Deus, consegui compor uma pequena Bíblia, escrevendo em pedaços de papel tirados dos que a policia me fornecia para responder às inúmeras questões que me colocavam. Como me tinham permitido escrever para casa, consegui que me enviassem uma garrafa de vinho, como remédio para a dor de estômago e algumas hóstias escondidas numa tocha. Isso permitiu-me de celebrar diariamente a eucaristia”.
A pressão internacional fez com que em 13 de maio de 1978, festa de nossa Senhora de Fátima, Van Thuân fosse novamente enviado para a prisão domiciliar a Giang Xa, a vinte quilômetros de Hanói, a capital. Foi Transferido novamente em cinco de novembro de 1982. “As provas e humilhações não faltaram, mas o amor para a redenção que alimentava todos os dias com a eucaristia e a oração me davam força e luz para entrar na alma dos meus carcereiros. Por essa razão eu era considerado um prisioneiro perigoso, porque em qualquer lugar que estava preso, consegui transformar a ideologia do ódio em paz para todos, vítimas e carrascos. Isso num mundo que negava a própria hipótese de Deus era em verdade intolerável”.
Finalmente, em 21 de novembro de 1988, quando no calendário se celebra a festa da Apresentação de Nossa Senhora ao Templo, Van Thuân foi libertado. “Na minha mente veio logo este pensamento: ‘Nossa Senhora me libertou!'”, relata o cardeal.
Foram quinze anos de cárcere, dos quais nove em total isolamento, sem nunca ter tido um processo e uma condenação. Mas mesmo assim continuou a surpreender as pessoas, ao responder a um jornalista se agora seria feliz, respondeu, deixando-o sem palavras: “mas, eu era feliz também antes”.
Van Thuân foi expulso de seu país e escolheu Roma como lugar de seu exílio. Outra pessoa, talvez, naquele momento teria escolhido se retirar da vida privada, mas o serviço autêntico ao Evangelho não conhece as lógicas humanas. Em 24 de junho de 1998, foi nomeado presidente do Pontifício Conselho da Justiça e da Paz. “O homem certo, no lugar certo” disseram muitos, e não se enganaram.
Foi oferecendo o seu testemunho em inúmeras viagens, pregações e conferências, transmitindo sua imagem humana de perdão, reconciliação e esperança, atraindo multidões de jovens e menos jovens que não conseguiam entender como era possível continuar a sorrir e ser alegre depois de uma vida tão dramática, em que tudo lhe tinha sido tirado: afetos familiares, os fiéis, a casa, a igreja e enfim a própria dignidade humana.
Ele continuou a surpreender até ao fim de sua vida. Em 2000, o Papa João Paulo II, com espanto geral da cúria romana, o convida a ditar as meditações dos exercícios espirituais. O resultado foi uma coletânea de pensamentos comoventes, extraordinariamente concretos, inspirados nos seus treze anos de cárcere. Não faltam expressões otimistas e humoristas, como quando ela fala dos “defeitos de Jesus”.
Criado cardeal em janeiro de 2001, do titulo de Santa Maria da Scala em Trastevere, sinal de uma vida vivida como mártir vivente. Van Thuân faleceu em 16 de setembro de 2002, deixando como testamento espiritual os textos dos últimos exercícios espirituais por ele pregados a um grupo de padres em que nos convida a descobrir a “Alegria da Esperança”. Todo seu sofrimento e o exemplo que deu em sua vida é, para nós da Pastoral Carcerária, fonte de grande inspiração e força.