Por Isabela Menedim
A primeira reunião do Grupo de Trabalho (GT) em saúde nos sistemas prisionais ocorreu na última segunda-feira (15). A saúde é um tema que sempre foi abordado pela Pastoral Carcerária, e que em 2022 começa a ser discutido mais a fundo, para que possíveis ações possam ser implantadas.
Pe. Almir José de Ramos, Vice Coordenador da Pastoral Carcerária Nacional e enfermeiro, e Ariél Philippi Machado, Professor e Teólogo, analisam a precariedade da saúde no cárcere e relatam os objetivos e dificuldades da inserção de um sistema de saúde adequado no sistema prisional.
“A saúde no cárcere é tema urgente na reflexão das políticas e dos atores públicos, visto que a realidade pós-pandemia afeta as pessoas, que inclui famílias de pessoas privadas de liberdade”, afirma Ariél. Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Qual o objetivo de vocês, como Grupo de Trabalho em saúde nos sistemas prisionais?
Ariél: O GT em saúde tem o objetivo de reunir pessoas com afinidade na área da saúde, profissionais de diferentes áreas, para apoiar as atividades dos membros e agentes da Pastoral Carcerária no cuidado da saúde das pessoas privadas de liberdade e na defesa dos direitos dessas pessoas, para terem melhor acesso aos recursos de saúde.
A criação do GT busca se apoiar e subsidiar as iniciativas em proteção da saúde das pessoas privadas de liberdade, tendo como apoio as situações de abrangência nacional, para incidir nos casos regionais, com ações desenvolvidas pelos agentes e profissionais no âmbito dos Estados e Municípios.
Quais os maiores desafios que vocês encontram no caminho?
Ariél: De maneira geral, o cenário nacional sobre a saúde no cárcere é muito precário. A Pastoral Carcerária se une na defesa dos direitos de uma saúde pública e de qualidade para todas as pessoas. E isso exige questionar sobre a assistência básica de saúde para pessoas privadas de liberdade, o que fica aquém do mínimo da atenção especializada que toda pessoa precisa.
Principalmente em casos específicos, por exemplo, assistência em obstetrícia, ginecologia, psiquiatria, pediatria e outros. Outro desafio se trata do acesso a exames de rotina, que no cenário das pessoas privadas de liberdade se evidencia como “tortura”, com tamanha dificuldade de acesso e de disponibilidade.
Os casos de omissão frente à saúde pública precisam ser denunciados e também alavancados por profissionais e entidades, como no caso da Pastoral Carcerária.
Outro elemento de grande desafio é a situação da saúde mental, incluindo a questão das drogas, que merece atenção especial quanto ao modo de apoio e articulação junto à pessoa privada de liberdade. A saúde no cárcere é tema urgente na reflexão das políticas e dos atores públicos, visto que a realidade pós-pandemia afeta as pessoas, que inclui famílias de pessoas privadas de liberdade.
O que um profissional da saúde deve saber, fora conhecimentos técnicos, para trabalhar com pessoas privadas de liberdade?
Pe. Almir: Todas as pessoas da área da saúde, independentemente de ser profissional ou não, tem que ter bastante essa dimensão humanitária, esse respeito pela pessoa humana e a disposição de lutar pelos direitos, uma vez que esses direitos dentro do sistema prisional muitas vezes são negados, então tem que lutar muito.
Deve ser alguém que vá ao encontro dessas pessoas sem julgamento, sem preconceitos e que tenha obviamente esse conhecimento técnico, senão não tem como trabalhar com essas pessoas nessa dimensão.
E também esse compromisso evangélico que a Pastoral Carcerária tem, principalmente para lutar contra o encarceramento e pelo mundo sem cárcere.
Como a falta desse direito à saúde afeta os presos e seus familiares?
Pe. Almir: A falta de acesso à saúde afeta porque a pessoa vai ficar doente, vai morrer, muitas vezes sem ser atendido.
E com isso vem toda a questão da discriminação e a questão da exclusão, quando o preso tem que sair da unidade prisional para ser atendido na Unidade Básica de Saúde, ou mesmo nos hospitais, as pessoas que estão esperando para serem atendidas veem ele chegando com escolta armada, como se aquele preso fosse uma pessoa extremamente perigosa, e vai aumentando mais no imaginário do povo que ele é uma pessoa perigosa mesmo.
Eles são muito humilhados nesses espaços, as pessoas têm medo deles. Então o acesso dentro das unidades prisionais seria bem melhor porque evitaria isso.
E afeta a família porque se o preso pega doença lá dentro, ele pode transmitir para os familiares, ou se ele tem doença que traz de fora e não trata ali, quando ele volta, a família recebe ele com mais um problema do que já tinha, ou o problema piorou. Então é uma série de questões que precisam ser revistas.