“O problema da fome nas prisões do Brasil está diretamente ligado à privatização”, afirma Pastoral e organizações sociais à ONU

 Em Combate e Prevenção à Tortura, Notícias

Uma série de organizações sociais, dentre elas a Pastoral Carcerária Nacional, participaram na manhã desta quarta-feira (17) de uma reunião online com a relatora da ONU Lilit Nikoghosyan, para tratar da segurança alimentar nas prisões brasileiras. Estavam presentes o IDDD, o Mecanismo Nacional de Combate e Prevenção à Tortura, a Amparar e o NESC.

A Pastoral foi representada pela sua coordenadora nacional, Ir. Petra Pfaller, que em sua fala afirmou que “o problema da fome nas unidades prisionais do Brasil está diretamente ligado à privatização”. Após citar casos nos quais a iniciativa privada foi beneficiada em processos de licitação, oferecendo alimentação de péssima qualidade, ela relata que mais da metade das denúncias de tortura recebidas pela PCr se referem à alimentação. “No último relatório divulgado de análise dos casos de tortura registrados em nosso banco de dados, constatamos que 55% das denúncias falavam sobre problemas com alimentação: tanto o fornecimento de alimentos estragados, com larvas de inseto, até o oferecimento de 2 refeições diárias”. 

Por fim, a coordenadora da PCr propõe que haja uma fiscalização dos contratos, cozinhas, armazenamentos e transporte realizadaos pelas empresas que fornecem alimentações, via um comitê composto pela Defensoria Pública, Mecanismos, familiares de presos e da sociedade civil.

Confira abaixo a íntegra da fala de Ir. Petra:

Bom dia a todos e todas presentes. Sou Ir. Petra, estou coordenadora nacional da Pastoral Carcerária do Brasil, que é uma pastoral sociotransformador da Igreja Católica. Estimado relator, gostaria de iniciar minha fala fazendo uma constatação: o problema da fome nas unidades prisionais do Brasil está diretamente ligado à privatização.

A iniciativa privada, aliada ao Estado brasileiro, encontrou uma forma de lucrar com a fome dos pretos e pobres encarcerados. Em 2020, no Ceará, a empresa ISM Gomes de Mattos, responsável pela alimentação de 14 penitenciárias do estado, foi acusada de receber por refeições duplicadas nos mesmos presídios e por refeições para presídios que ainda estavam em construção ou desativados. Em 2021, no estado de Goiás, o Tribunal de Contas do Estado apontou indícios de que a empresa responsável pela alimentação no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia foi beneficiada no processo de licitação. No mesmo ano, a OAB de Goiás visitou unidades do complexo e constatou que a comida oferecida era de péssima qualidade.

Enquanto Pastoral Carcerária Nacional, recebemos diariamente denúncias de violações de direitos nos presídios do Brasil. No último relatório divulgado de análise dos casos de tortura registrados em nosso banco de dados, constatamos que 55% das denúncias falavam sobre problemas com alimentação: tanto o fornecimento de alimentos estragados, com larvas de inseto, até o oferecimento de 2 refeições diárias. Quando enviamos os casos aos órgãos de execução penal e, portanto, fiscalizadores, recebemos as mais variadas respostas. Recentemente, uma juíza afirmou em resposta que, devido à terceirização, “pode ser que ‘uma ou outra’ marmita chegue imprópria para consumo”. Percebemos que, devido à delegação da tarefa ao setor privado, o Poder Público se exonera de fiscalizar os contratos com as empresas.

Visando este panorama, nós da Pastoral Carcerária Nacional reivindicamos que o Estado brasileiro seja obrigado a implementar comissões estaduais permanentes de fiscalização dos contratos, das cozinhas, do armazenamento e do transporte realizados pelas empresas terceirizadas que fornecem as alimentações. Essa comissão deverá ser composta por Defensoria Pública Estadual, Sistema Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (Mecanismos e Comitês), familiares e sociedade civil, com posterior envio do relatório para o Tribunal de Contas. Deverá ser vedada a participação de funcionários das empresas terceirizadas e de unidades prisionais, para maior lisura do processo. Reivindicamos, ainda, a vedação da existência de cozinhas externas às unidades prisionais.

Agradecemos pelo espaço e nos colocamos à disposição para pensar encaminhamentos.

 

DEIXE UM COMENTÁRIO

Volatr ao topo