Por Pedro Canário
Do Conjur
A Defensoria Pública de São Paulo, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e a Pastoral Carcerária pediram que o Conselho Nacional de Justiça casse todas as nomeações do Tribunal de Justiça do estado para o Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo), órgão responsável por processar inquéritos e promover as audiências de custódia.
Em pedido de providências, os autores afirmam que a nomeação da equipe, por ato discricionário da Corregedoria-Geral do TJ, desrespeita norma estadual que criou um rito para a ocupação dos cargos.
A Lei Complementar Estadual 1.208/2013 diz que os nomes devem ser escolhidos pelo Conselho Superior da Magistratura (cúpula da corte), a partir de uma lista de candidatos e conforme o histórico e a reputação dos interessados.
Mas a equipe que está lá hoje, chefiada pela juíza Patrícia Alvarez Cruz, foi nomeada pelo corregedor-geral, desembargador Geraldo Pinheiro Franco, que disse à ConJur ter indicado unilateralmente a juíza, por mérito. A indicação, portanto, foi apenas ratificada pelo Conselho da Magistratura.
Mão pesada
A motivação não dita para questionar a constituição do Dipo é a chefe do departamento. Assumidamente dura na aplicação da lei e seletiva quanto à jurisprudência do Supremo, Patrícia é apontada como principal responsável por mudanças na audiência de custódia.
A iniciava garante o direito de que presos em flagrante sejam ouvidos por um juiz em até 24 horas. A intenção é que o magistrado verifique as condições em que o preso se encontra e avalie se é necessário manter a pessoa solta ou atrás das grades, na presença de um defensor e um representante do Ministério Público.
O Tribunal de Justiça de São Paulo foi o primeiro a implantar modelo do CNJ que acabou propagado pelo país, em iniciativa que completará três anos neste sábado (24/2). Segundo a Defensoria, o IBCCrim e a Pastoral Carcerária, a nova gestão do Dipo fez o projeto desandar.
Enquanto 52% das audiências de custódia resultaram em prisões preventivas entre fevereiro de 2015 e abril de 2017, em São Paulo, conforme pesquisa da ONG Fórum Nacional de Segurança Pública contratada pelo CNJ, o índice subiu em fevereiro deste ano.
Desde que Patrícia Cruz assumiu o cargo, foram 73% preventivas decretadas, segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo. De acordo com a Defensoria, as provisórias foram decretadas em 67% dos casos no plantão judiciário, quando não é o Dipo quem faz as audiências, mas os juízes do plantão.
A petição da Defensoria e das entidades também acusa a juíza e sua equipe de desrespeitar a jurisprudência do Supremo, já que desde o início do ano o Dipo praticamente não concedeu liberdade a presos em flagrante por tráfico. Isso demonstraria a posição dos magistrados de continuar considerando o tráfico de drogas, mesmo o privilegiado, como equiparado ao hediondo, contrariando decisão do Plenário do STF – mas obedecendo à jurisprudência do TJ de São Paulo.
Segundo a pesquisa da Fórum Nacional de Segurança Pública, com base em dados das secretarias de segurança dos estados, a média nacional da conversão de flagrante em provisória para acusados de tráfico é de 57,2%. No Dipo de São Paulo, a média é 93,2%.
“Tal cenário de desrespeito aos entendimentos e súmulas das cortes superiores é um dos alicerces do encarceramento em massa nesta República”, conclui a petição.
A lei paulista sobre nomeações de juízes com base no histórico é questionada no Supremo Tribunal Federal por meio de ação de autoria da Procuradoria-Geral da República.
“Se a lei, que prevê a inscrição de juízes interessados e escolha pelo Conselho da Magistratura com base no histórico profissional, já é inconstitucional, um ato normativo que não obedece a lei nem a critério objetivo algum é, obviamente, inaceitável”, resume a petição.
O documento é assinado pelos defensores Mateus Oliveira Moro, Thiago de Luna Cury e Leonardo Biagioni de Lima, do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria, e pelo ouvidor-geral da instituição, Alderon Costa. Também pelo presidente do IBCCrim, Cristiano Maronna, e por Paulo Cesar Malvezzi, da Pastoral Carcerária.
Clique aqui para ler o pedido de providências.