Jaqueline Deister
Do Brasil de Fato
O pacote anticrime apresentado em fevereiro pelo ministro da justiça e segurança pública Sergio Moro está em tramitação no Congresso Nacional. A medida prevê alteração no Código Penal, no Código de Processo Penal e na Lei de Execução Penal e se tornou a principal plataforma de gestão do ex-juiz.
O projeto do Moro tem reascendido o debate sobre o sistema prisional brasileiro. O aumento do encarceramento em massa tem sido apontado por parte da comunidade jurídica e acadêmica como um remédio já conhecido e pouco eficiente para o país.
Segundo o último levantamento realizado pelo Banco Nacional de Monitoramento das prisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e disponibilizado para o Brasil de Fato, em outubro o país estava com uma população carcerária de 836.820 presos. O número ultrapassa os habitantes do município de Nova Iguaçu, na região metropolitana do estado do Rio, que, de acordo com estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), está com uma população de 821.128 habitantes.
Para Maria Gabriela Peixoto, ex- ouvidora do Departamento Penitenciário Nacional e doutora em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o projeto peca por não ter um estudo de impacto e por apostar no recrudescimento de pena como alternativa para o combate ao crime.
“Essa suposta solução existe desde que o Brasil existe e nunca mostrou ser eficaz no combate ao crime e na nossa situação na sociedade. No Brasil, porque é uma prisão seletiva, estamos falando de pessoas empobrecidas, negras, que já tiveram num contexto de vulnerabilidade anterior muito acirrado, sem acesso às políticas públicas, saúde, educação, trabalho. Esse campo de vulnerabilidade anterior é o campo que colocou essas pessoas na frente desse processo de encarceramento”, explica.
No estado do Rio de Janeiro, dados de outubro do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do Tribunal de Justiça do Estado do Rio apontam que a população carcerária do Rio estava em 53.027 presos, dos quais, 52.316 em regimes provisório, semiaberto e fechado. Segundo a Defensoria Pública do Rio, o estado possui 28 mil vagas no sistema prisional.
Peixoto alerta que a situação de superlotação do estado do Rio se reflete na maior parte do território nacional e que o agravante deste problema é a insalubridade e a ausência de políticas públicas que ocorrem dentro dos espaços prisionais obrigando os presos a viverem em situação de degradação humana. De acordo com a ex- conselheira do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciário (CNPCP), pensar em soluções para o sistema prisional brasileiro atravessam a porta de entrada e saída dos presídios.
“A maior parte das pessoas que estão encarceradas no nosso sistema prisional são pessoas que cometeram pequenos tráficos, furtos e roubos e existem outras medidas de responsabilização para esse tipo de crime. Pensar a porta de saída é justamente pensar que não é aumentando o tempo de pena que a gente vai trazer um cenário qualificado melhor; e sim, diminuindo a vulnerabilidade que essas pessoas são submetidas quando saem do sistema prisional. Podemos pensar pelo contrário do que se propõe o projeto anticrime, essas pessoas terem acesso a políticas, encaminhamento para emprego, políticas de egressos, alternativas ao sistema, diminuir o tempo de custódia, na verdade, a progressão de regime, o livramento condicional, já que as situações do nosso sistema prisional se mostraram precarizadas e com uma sobrepena para as pessoas”, ressalta.