O assessor da Pastoral Carcerária Nacional, Padre Gianfranco Graziola, missionário da Consolata, comenta a decisão do Papa Francisco de mais uma vez realizar na prisão a missa com o rito do Lava-pés. Sua reflexão é inspirada na frase que o Pontífice repete com frequência: “Por que eles e não eu?”.
Pe. Gianfranco Graziola – Cidade do Vaticano
O Papa Francisco volta mais uma vez a celebrar a Ceia do Senhor com o rito do Lava-pés entre os muros de um cárcere, escolhendo este ano Velletri, na Província de Roma. Todas as vezes que Francisco encontra o mundo do cárcere costuma repetir uma frase que virou um lema: “Por que eles e não eu?”
Estas palavras que parecem ser tão simples, na realidade são um grande questionamento que Francisco coloca a si próprio, mas também a cada um e cada uma de nós que acha normal que uma pessoa pague, ou seja, castigada pelos seus atos e, consequentemente, encarcerada.
Mundanismo espiritual
Ajuda-nos a compreender melhor esta provocação do Bispo de Roma o texto da comunidade de João, que, ao invés de nos narrar as palavras da instituição da Eucaristia, coloca no centro o Lava-pés, dizendo-nos que para seguir Jesus é preciso fazer um dúplice movimento: deixar-nos lavar os pés e lavar os pés uns dos outros.
No diálogo entre Jesus e Pedro, sobressai o que muitas vezes nós somos: arrogantes e autorreferenciais, chegando a afirmar como ele: “Tu nunca me lavarás os pés!”. Com o resultado que nossa vida cristã se reduz à superficialidade e ao mundanismo espiritual.
Precisamos ouvir mais uma vez como Pedro as palavra claras de Jesus: “Se não te lavar os pés não terás parte comigo”. É preciso assumir a atitude de serviço, de humildade, de entrega do mestre se quisermos entrar e tomar parte da vida e do projeto dele que Francisco, sucessor de Pedro e Bispo de Roma, expressa não apenas em suas palavras, mas concretamente em suas ações, como o partilhar a mesa com os pobres, com nossos irmãos de rua, com os encarcerados e encarceradas ou visitando nas sextas-feiras da misericórdia realidades e situações que expressam concretamente o lavar e deixar-se lavar os pés – fato que acontece todas as vezes que nos colocamos na escuta atenta e fraterna das dores e das angústias de quem não tem vez e voz, de quem é invisível em nossa sociedade de consumo e muitas vezes também em nossos templos.
Por isso, também um dos últimos gestos de Papa Francisco de se abaixar e beijar os pés dos lideres políticos do Sudão do Sul expressa uma inversão da lógica onde a verdadeira força da transformação está no serviço, expressão da civilização do amor.
João Crisóstomo afirmava:
“Todas as vezes que vedes um pobre (…), recordai-vos que tendes sob os vossos olhos um altar.”