“A Pastoral Carcerária não é contra a redução da maioridade penal. A Pastoral Carcerária é contra o encarceramento em massa em todos os aspectos que ele apresenta hoje. A redução da maioridade penal é um sintoma de uma doença muito maior que tem comido esse país há muito tempo, em especial nossa juventude preta, pobre e periférica”.
A afirmação é de Paulo Cesar Malvezzi Filho, assessor jurídico nacional da Pastoral Carcerária, e foi feita em 27 de abril, quando ele foi um dos debatedores de um evento em São Paulo, organizado pela Fundação Perseu Abramo, Ação Educativa e Fundação Rosa Luxemburgo, para discutir a redução da maioridade penal no Brasil.
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Paulo, ao recordar as recentes visitas a unidades prisionais no Amazonas, relatou casos de presas violentadas sexualmente e de precárias condições, como na Penitenciária de Tefé. “Eu não tenho dúvidas que ninguém guardaria sequer um porco lá dentro. É um esgoto humano, com fiação exposta, misturada com infiltração prestes a dar um curto circuito e queimar todas as pessoas lá dentro, um lugar horrível, uma das piores unidades que eu já entrei na minha vida, com toda a certeza”.
Nesse contexto de calamidade prisional, que se repete em outras partes do País, Paulo indagou aos participantes do evento: “Qual o papel os adolescentes desempenhariam dentro dessas unidades? Como ver criança de 16 anos em um ambiente desse, com mulheres servindo de empregadas de homens para objeto sexual? Somente uma pessoa insana para defender a redução da maioridade penal”.
O assessor jurídico da PCr Nacional criticou o ideário punitivista que impera na sociedade brasileira e considerou que o centro das lutas deve ser o desencarceramento de qualquer pessoa, independentemente da faixa etária. “Nosso debate e nossa luta é pelo desencarceramento e não há outra opção: hoje o Brasil não tem condições de manter mais nenhuma pessoa presa, em qualquer tipo de presídio. É desencarceramento ou barbárie”.
Segundo Paulo, os adolescentes hoje aprendidos vivem em condições degradantes semelhantes aos presos. “A Fundação Casa e as demais unidades de internação não se diferenciam em nada das unidades prisionais. Ali há problemas de tortura, maus tratos, superlotação, problemas de ausência de serviços básicos campeiam de uma unidade a outra em todos os locais do Brasil. A redução pra eles já é uma realidade: vivem como em presídios, são tratados como presos, formam grupos como presos, para todos os efeitos são como presos maiores de idade”.
Paulo Malvezzi também alertou que não basta concentrar atenções contra a redução da idade penal. “Não adianta a gente vencer a redução da maioridade penal e deixar que esses jovens e adolescentes fiquem por mais tempo nessas masmorras mirins. A nossa luta é contra o cárcere e é contra o sistema penal, que é seletivo ao extremo, é racista ao extremo”, afirmou. “Nossa luta deve ser contra a expansão do direito penal, de novos tipos penais que surgem todo o dia. Temos que lutar contra essa lógica penal que está enraizada bem fundo nas nossas estruturas econômicas e sociais. Faço um apelo para que não façamos essa luta isolada”, completou.
Além de Paulo Malvezzi, participaram do evento Rogério Sottili, secretário-adjunto de Direitos Humanos e Cidadania da prefeitura de São Paulo, que enfatizou que o jovem é a principal vítima e não o responsável pela violência do País; e a uruguaia Verónica Silveira, representante da campanha “No a la baja”, que recordou que no Uruguai, em plebiscito no ano de 2014, 53% da população disse não à proposta de redução da idade penal.
De acordo com dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, menos de 1% dos homicídios no Brasil é praticado por adolescentes. No entanto, os jovens representam 36% das vítimas dos homicídios.