Irmã Petra: ‘A situação da mulher no sistema prisional é muito mais difícil’

 Em Mulher Encarcerada

Irma_Petra_entrevistaNo começo de outubro, a Irmã Petra Silvia Pfaller, coordenadora nacional da Pastoral Carcerária para a Questão da Mulher Presa esteve em Porto Alegre (RS), onde assessorou o 1° Encontro Regional do GT nacional da mulher presa, entre os dias 2 e 4.
Na oportunidade, concedeu entrevista ao jornalista Judinei Vanzeto, do Regional Sul 3 da CNBB (Rio Grande do Sul), onde comentou sobre a realidade das presas em todo o Brasil e especificamente nas unidades prisionais gaúchas. Irmã Petra também reafirmou o posicionamento da PCr nacional por um mundo sem prisões: “Se o presídio resolvesse já seria uma solução para a violência. É uma justiça vingativa que não educa!
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Reproduzimos a seguir, alguns dos trechos da entrevista concedida pela Irmã Petra ao Regional Sul 3 (RS3).
 
RS 3: Qual a sua atividade atualmente?
Irmã Petra: No momento, trabalho como coordenadora nacional para a Questão da Mulher Presa da Pastoral Carcerária da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Vim aqui para o Rio Grande do Sul e visitei alguns presididos em Caxias do Sul e Bento Gonçalves. Com a equipe local fomos visitar os presídios com mulheres encarceradas (..) Hoje, normalmente, nos cárceres se olha mais para a questão dos homens. Os presídios em geral foram feitos por homens e para os homens. Atualmente, no Brasil, há cerca de 640 mil homens presos e entorno de 35 mil mulheres presas. Muitas vezes, elas estão com seus filhos pequenos. No Rio Grande do Sul, o número de mulheres presa chega a duas mil. Nos últimos seis anos triplicou o número de mulheres presas. Essa é uma das razões para a Pastoral Carcerária ter um olhar específico para elas. As consequências do encarceramento para a mulher são muito mais grave em comparação aos homens presos.
 
RS 3: Soube que a senhora fez uma visita a Secretaria de Segurança do Rio Grande do Sul. Qual foi sua sensação neste contato?
Irmã Petra: Fiquei bem surpresa com os projetos que a equipe técnica esta fazendo e os sonhos de implantar para a população encarcerada feminina. Estou curiosa para conhecer o presídio feminino Madre Pelletier, de Porto Alegre. A Pastoral Carcerária é sempre uma parceira dos projetos que dão certo. Como a Pastoral Carcerária denuncia quando tem casos de tortura e desrespeito a dignidade do ser humano, também apoia projetos. Nas capitais é comum ter presídios só femininos, mas no interior, como percebi nas visitas que fiz, tem uma ala com um corredor e lá estão as mulheres no mesmo presidido dos homens. Ficam todo o dia trancadas porque não pode misturar. Não podem participar das atividades da Pastoral Carcerária porque a direção não permite misturar. Temos que ter um olhar mais específico para as mulheres que dentro da questão carcerárias são as últimas. Elas precisam de material de higiene e muito cuidado. Vi que no Rio Grande do Sul há muitas mulheres presas com filhos recém-nascidos. Nós como Igreja precisamos olhar para essa realidade.
 
RS 3: E quando a mulher presa esta grávida?
Irmã Petra: Percebi que aqui no Rio Grande do Sul as mulheres do interior quando estão grávidas e, já no quinto ou sexto mês, como não tem maternidade e berçários, são trazidas para presídio da capital. Esses presídios da capital têm condições de acolher a gestante, que pode ficar até um ano. A situação da mulher no sistema prisional é muito mais difícil. Normalmente, o marido abandona a mulher que foi presa. As mulheres com maridos presos são muito mais companheiras e não abandonam, mas os homens abandonam com mais facilidade se a mulher foi presa. Se a mulher é do interior e transferida para presídio da capital é muito mais difícil para a família visitar, porque, geralmente, são os mais pobres que vão para a cadeia. A maioria da população carcerária é pobre. A dificuldade de apoio longe da família com criança é muito mais difícil. Tem que deixar a criança com a família. O governo não reconhece à necessidade e a importância de apoio à mulher presa. Por outro lado, isso vai muito da compreensão do juiz ou da juíza daquela vara, que pode decretar prisão domiciliar.
 
RS 3: Qual o perfil da mulher presa no Brasil?
Irmã Petra: Hoje, 65% das mulheres presas são por tráficos de drogas. A porcentagem dos homens por tráfico é de 45%. As mulheres, com algumas exceções, não fazem parte da hierarquia do crime por tráfico. Elas não são chefes da boca do fumo. É raro andarem armadas. A maioria das mulheres presas é pelo ditado “mulas”, ou seja, os donos das drogas terceirizam o carregamento da droga e as mulheres fazem isso. Fazem isso sem ser criminosas e o Poder Judiciário não faz a diferenciação. Dou um exemplo. Foi pega uma mulher na rodoviária com quatro quilos de maconha indo da cidade ‘A’ para a cidade ‘B’, já recebe oito anos de prisão por ser entendida como uma traficante perigosa. É um perfil de mulheres presas, que a meu ver, a Justiça deveria tratar diferenciado este tipo de delito. Depois que entra no sistema prisional ela é introduzido no conhecimento do mundo do crime. É difícil de sair!
 
RS 3: Fale sobre o fundamento para a ação da Pastoral Carcerária?
Irmã Petra: O próprio Jesus Cristo em Mateus 25 diz: “Estive preso e fostes me visitar”. Muitas vezes nós esquecemos isso que é uma ação de misericórdia. É muito comum quando alguém esta com fome ou doente receber assistência. Mas se esta preso, muitas vezes, esquecemos. O próprio Jesus deixou o mandamento mais difícil: perdoar! Pedimos no Pai-Nosso para nos perdoar e perdoar os outros, mas quando somos assaltados ou vemos pela televisão as notícias, a nossa reação é de vingança. Isso é muito grave! Se levarmos a sério a missão de Jesus Cristo, como missionário do Pai, nós visitamos as pessoas presas. Não visitamos o assassino, mas a pessoa. Visitamos o João, a Maria que estão atrás das grades. Existem situações degradantes que humanamente nem se fala, mas é a nossa fé. Como viajo muito pelo Brasil fico tocada com os agentes da Pastoral Carcerária que todas as semanas atravessam as grades e a barreira da polícia para estar lá junto com os presos. Vão lá para estar juntos e não para convertê-los, mas para estar junto. Exercem a pastoral da escuta. Estar junto para reconhecer a pessoa, dar uma palavra de esperança e rezar se eles querem. Também de denunciar casos de tortura, falta de alimentação e de assistência à saúde. São quase seis mil agentes pelo Brasil.
 
RS 3: Os presídios brasileiros ressocialização as pessoas? 
Irmã Petra: A ressocialização é mentira. É um palavrão. O Brasil é o terceiro país no mundo que mais encarcera. Aliás, encarceram os pobres, os negros, os favelados, os jovens. Mesmo assim a violência esta aumentando no país. Se o presídio resolvesse já seria uma solução para a violência. É uma justiça vingativa que não educa!
 
RS 3: A Pastoral Carcerária do Rio Grande do Sul esta bem avançada na questão do Projeto da Justiça Restaurativa. As mulheres estão dentro desse projeto?
Irmã Petra: Partilho o que percebi e me contou a Irmã Imelda Maria Jacoby, coordenadora da Pastoral Carcerária do Regional Sul 3. Graças a Deus, o projeto que nós apostamos e seguimos as orientações do Nacional foi abraçado e esta tendo bastante a Pastoral Carcerária do Regional. Disse-me a Irmã Imelda, que trabalha dentro das unidades, particularmente na Quarta Região da Delegacia, que as mulheres já tem tido a oportunidade de fazer o curso da Justiça Restaurativa. Inclusive um presídio na região de Sarandi a própria diretora fez o curso e agora esta ministrando para as presas. Temos no Rio Grande do Sul a dificuldade de fazer um trabalho separado, mas em diversas cidades temos unidades de presídios mistos que somam no estado 57 presídios de mulheres junto com homens separadas por ala. A minha experiência, como, por exemplo, em Passo Fundo, temos um dia específico só para o atendimento das mulheres. Entramos nos alojamentos e temos aproximação de ouvi-las. Temos essa permissão por parte dos administradores, como também em casos que encontramos mais dificuldades de trabalhar só com as mulheres.
 
RS 3: Alguma mensagem final?
Irmã Petra: Quando as pessoas falam “vamos evangelizar as pessoas presas” eu digo “nós não vamos levar Jesus no presídio. Ele já esta lá”. E quando vamos visitá-los encontramos o rosto de Jesus que disse: “Estive preso e fostes me visitar”! Por isso, vamos lá e encontramos o rosto de Deus. Eu fico muito grata por todas as experiências de fé quando tenho oportunidade de partilhar.
 
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