Solenidade de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Mãe das/os pobres

 Em Igreja em Saída

Padre Gianfranco Graziola, vice-coordenador da Pastoral Carcerária Nacional
Com esta festa começamos em todo o Brasil o Ano Mariano, ocasião para ir além do simples pietismo ou da tentação de reduzir tudo a um conjunto de celebrações e manifestações bonitas e ao mesmo tempo vazias. A caminhada do povo de Deus nos mostra o papel fundamental da mulher que os textos da escritura nos ajudam a resgatar. Basta pensar na força da mãe dos sete irmãos Macabeus, capaz de suportar a dor do assassinato dos filhos em prol da fidelidade ao sonho de seu povo (Cf. 2 Mac). São muitas as mulheres na história da libertação, que encarnam o projeto de Reino, por quem o Deus Todo-Misericordioso vai construindo novas relações e novas estruturas: Rute, Maria Madalena, Lidia, Isabel, etc.
Os textos da Palavra que foram escolhidos para a celebração de nossa Mãe Aparecida nos apresentam claramente o que dissemos acima: a mulher, que num contexto fortemente machista, patriarcal e excludente, com sua sensibilidade, força e feminilidade, consegue captar a situação do momento, as ameaças, as barreiras, os obstáculos que prejudicam o presente e o futuro da vida do povo. Assim, Ester, mulher judia, esposa do rei dos persas, não hesita em intervir na hora certa, colocando sua vida como garantia para o futuro de seu povo. Por outro lado, Maria assume um papel decisivo na história, em Canaã, na Galileia, onde o povo, celebrando a vida, de repente se encontra em apuros: as pedras que pareciam proporcionar vida e fecundidade secaram: não têm mais vinho. Os pobres parecem estar lascados, mas a pobre, a anawim, não perde a esperança, desafia leis e prescrições, rompe com sua própria tradição e cultura, transforma as pedras em potes que jorram a alegria, a vida plena.
E como não ler neste contexto o desafio que a mulher presa coloca ao nosso tempo? Não será ela um ponto de ruptura com uma determinada história, um determinado sistema de opressão, também religioso, onde as palavras do velho Simeão se tornam profecia de um novo povo, de um novo sonho: “um mundo sem cárceres”? E com ela, como não lembrar das mulheres, jovens e não jovens, negras, indígenas, periféricas, feitas mercadoria, reduzidas à invisibilidade que, quebrando o silêncio, o esquecimento, a escravidão, o encarceramento em massa, a humilhação, como “Marias” de nosso tempo levantam sua voz para gritar ao mundo que, nelas o Todo-Misericordioso e Amoroso realizou grandes obras, fez proezas com seu braço, derrubou os poderosos e elevou os humildes, saciou a fome dos famintos e deixou os ricos de mãos vazias, manifestando sua misericórdia que é para sempre. Quantas e quantas “Marias” que mesmo rejeitadas e estigmatizadas pela sociedade punitiva não abrem mão de estarem junto àqueles e àquelas que são cotidianamente maltratados e torturados pelo sistema que produz sobras e massacres, mas que, misturando dor e alegria, possuem a “estranha mania de ter fé na vida”.
E juntos com elas podemos invocar a Mãe dos pobres:
“Maria, mãe dos pobres e dos pequenos, daqueles que nada têm, que sofrem a solidão porque não encontram compreensão alguma. Obrigado por nos ter dado o Senhor. Sentimo-nos felizes e com o desejo de contagiar muitos com essa alegria.
De gritar para os homens que se odeiam que Deus é Pai e nos ama.
De gritar para quantos têm medo: ‘Não temais’.
E aos de coração cansado: ‘Para frente, porque Deus nos acompanha’.
Mãe de quem está a caminho, como você, sem encontrar acolhida e hospitalidade.
Ensina-nos a sermos pobres e pequenos. A não termos ambições.
A sair de nós mesmos e a comprometer-nos para ser mensageiros da paz e da esperança.
Que em lugar da violência reine o amor.
Que a justiça reine entre os homens e os povos.
Que da verdade, justiça e amor surja a verdadeira paz de Cristo, da qual como Igreja somos sacramento.” (Eduardo Francisco Pironio)

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