Ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, constata superlotação em presídio gaúcho

 Em Combate e Prevenção à Tortura

Em visita surpresa ao Presídio Central de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deparou-se com a realidade de superlotação carcerária daquela unidade prisional, uma situação que se repete em todo o país: o presídio tem capacidade para 1.905 presos, mas lá estão encarceradas 4.683 pessoas.
Durante cerca de uma hora, a ministra de perto o caos do sistema prisional no Rio Grande do Sul. “O problema principal é o número excessivo de presos, sem condições, portanto, de dar cumprimento integral ao que foi determinado pelo STF, ou seja, fazer com que as pessoas estejam lá em condições de dignidade. O que alguns disseram é que não há sequer espaço físico para que todos possam deitar e dormir”, afirmou a ministra Cármen Lúcia em entrevista coletiva à imprensa, após a visita.
Por conta da superlotação permanente, em dezembro de 2013, a Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) emitiu medidas cautelares que determinaram ao Estado brasileiro que reassumisse o controle das galerias e pavilhões do Presídio Central de Porto Alegre que se encontram sob comando dos próprios presos e que reduzisse a superlotação da unidade prisional, entre outras providências.
A demolição de um dos pavilhões pelo governo estadual, em dezembro de 2014, agravou ainda mais a situação. Para garantir a convivência e a sobrevivência da população carcerária, a direção do presídio se diz obrigada a fazer uma espécie de manejo constante nas dependências do estabelecimento das facções criminosas, que agem no local.
O excesso de detentos não julgados força o convívio com presos já condenados. Ao final dos mutirões carcerários que o CNJ fez no Rio Grande do Sul, tanto em 2011 como em 2014, recomendou-se a separação dos presos “de acordo com a situação processual, sexo, primariedade, idade e demais peculiaridades relevantes para a correta execução da pena”.
Durante a manhã, a ministra conversou com presos que participam de um projeto com foco no Presídio Central, o “Direito no Cárcere”, coordenado pelo juiz da Vara de Execuções Penais, Sidinei Bruzska. A maioria deles cobrou ajuda do poder público, em face das dificuldades em ingressar no mercado de trabalho após cumprir pena. Esse é o motivo, de acordo com as falas de muitos internos, que explica tamanha reincidência no crime. “Quando se entra no mercado de trabalho, a gente concorre com pessoas que não foram marginalizadas e excluídas da sociedade como nós. É por isso que o preso é mais vulnerável e volta a ser mão de obra do crime. O crime não é uma facção, não é uma pessoa que coordena. O crime é uma situação social, que é viva, é orgânica e trabalha por conta própria“, afirmou um dos detentos.
A lotação do presídio já beirava a capacidade máxima do presídio nos anos 1980, quando o médico da unidade, Clodoaldo Pinilla, começou a trabalhar na unidade. “A população variava entre 1,6 mil e 1,8 mil presos. Chegou a 5,3 mil homens nos anos 2000. Com a violência aumentando, como é que fica a população? Só se prende e manda para cá”, afirmou o médico, que se orgulha de atender a todos os presos como pacientes. “Eu tenho de atender pacientes, o Estado é responsável por eles. Não sou juiz nem promotor. E eles sempre me tratam com o maior respeito”, disse Pinilla.
Segundo um dos policiais que escoltou a comitiva que acompanhou a ministra, cães também são usados na prevenção às fugas e por isso são estrategicamente posicionados nos vãos entre os pavilhões. Em 2014, o relatório do Mutirão Carcerário do CNJ recomendou ao governo do estado do Rio Grande do Sul que retirasse a Polícia Militar da função de custódia. Sugeriu também que fosse fixado um prazo máximo para a desocupação definitiva do presídio, reiterando decisão da Justiça do Rio Grande do Sul de 1995. Tanto as recomendações do CNJ como a decisão judicial vêm sendo ignoradas até o momento.
A direção do presídio admite que, devido principalmente à superlotação, consegue oferecer atividades de ressocialização apenas para 2 mil dos quase 5 mil presos do “Central”. Os demais são atendidos por psicoterapeutas, mas passam o dia ociosos e sem a oportunidade de remir a pena, que é reduzida em um dia a cada três trabalhados, de acordo com a lei. Segundo o relatório da última inspeção do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), feita em 2012, “a maioria das atividades de trabalho desempenhadas pelos presos no interior das unidades dificilmente poderá ser aproveitada quando deixarem o cárcere, já que não objetiva o aprimoramento laboral do detento, motivo pelo qual, em regra, não são absorvidos pelo mercado de trabalho”.
A infraestrutura do local, construído em 1959, mostrou-se bastante deteriorada. Dos espaços acessados pela ministra Cármen Lúcia na visita, a exceção foi o setor de saúde, equipado com gabinetes odontológicos e farmácia abastecida. Em um dos pátios visitados foi possível observar calhas transbordando água suja que se acumulava nas caixas de esgoto, todas abertas, com espuma fétida salpicada do verde das fezes.
Após a visita, uma audiência pública foi realizada no Foro Central de Porto Alegre com representantes do sistema de justiça e da sociedade civil, entre os quais membros da Pastoral Carcerária, para colher propostas de melhoria para a situação prisional do Rio Grande do Sul. Entre as sugestões registradas pela presidente do CNJ e do STF, destacou-se um pedido por mais investimento no tratamento de dependentes químicos no sistema prisional.
Fonte: CNJ
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