O QUE É A PASTORAL CARCERÁRIA

“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias das pessoas de hoje, sobretudo das pobres e de todas aquelas que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias das discípulas e discípulos de Cristo.” (Gaudium et Spes)

“Estive preso e vieste me visitar” (Mt 25, 36). É com esse lema em mente que a Pastoral Carcerária (PCr), pastoral social ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), age junto às pessoas presas e suas famílias.

Com agentes presentes em todos os Estados do país, a PCr acompanha e intervém na realidade do cárcere brasileiro de forma cotidiana.

O Brasil tem atualmente a terceira maior população carcerária do mundo, em contínuo e exorbitante aumento desde o início dos anos 1990, revelando a perversa política de encarceramento em massa que está em curso no país, e que tem como alvo os grupos sociais marginalizados e empobrecidos, destacadamente jovens, negros e moradores/as das periferias e das áreas urbanas socialmente mais precarizadas.

A PCr, busca ser a presença de Cristo e de sua Igreja no mundo dos cárceres, caracterizado pela superlotação, condições insalubres e tortura sofrida pelas pessoas privadas de liberdade. Portanto, em seu trabalho de atendimento religioso às pessoas presas os/as agentes pastorais promovem um serviço de escuta e acolhimento, anunciam a Boa Nova, contribuem para o processo de iniciação à vida cristã e para a vivência dos sacramentos, e atuam no enfrentamento às violações de direitos humanos e da dignidade humana que ocorrem dentro do cárcere, pois “todo processo evangelizador envolve a promoção humana” (Doc. Aparecida, p.399). Assim, a evangelização concretiza-se de forma integral, seguindo as orientações da Igreja: “As profundas diferenças sociais, a extrema pobreza e a violação dos direitos humanos (…) são desafios lançados à evangelização” (Puebla, 90).

Está claro que encarcerar mais pessoas, em sua maioria pobres e negras, não diminui a violência; ao contrário, o encarceramento serve para torturar as pessoas mais pobres e gerar ainda mais violência.

É urgente e necessário que se paute e defenda um urgente e necessário programa de redução da população carcerária. Visando isso, a Pastoral, em parceria com diversas outras organizações, movimentos e pastorais sociais, lançou em 2013 a Agenda Nacional Pelo Desencarceramento.

O documento visa viabilizar o desencarceramento e fortalecer as práticas comunitárias de resolução pacífica de conflitos, por meio de diretrizes como:

  • Suspensão de qualquer investimento em construção de novas unidades prisionais;
  • Limitação máxima das prisões cautelares, redução de penas e descriminalização de condutas, em especial aquelas relacionadas à política de drogas;
  • Ampliação das garantias da execução penal e abertura do cárcere para a sociedade;
  • Proibição absoluta da privatização do sistema prisional;
  • Combate à tortura e desmilitarização das polícias, da política e da vida.

Com essas propostas e diretrizes, seguimos em frente na luta por um mundo sem cárcere!

Características da Pastoral Carcerária
1) Está junto das pessoas privadas de liberdade. Só a proximidade que nos faz amigos nos permite apreciar profundamente os valores das pessoas privadas de liberdade, seus legítimos desejos e seu modo próprio de viver a fé. À luz do Evangelho reconhecemos sua imensa dignidade e seu valor sagrado aos olhos de Cristo, pobre como eles e excluído como eles. Desta experiência cristã compartilharemos com eles a defesa de seus direitos”. (DA.398)

2) Busca a Libertação integral. Consciente de que precisa enfrentar as urgências que decorrem da violência e da miséria do sistema prisional, o agente de Pastoral Carcerária sabe que não pode restringir sua solidariedade ao gesto imediato da doação caritativa. Embora importante e mesmo indispensável, a doação imediata do necessário à sobrevivência não abrange a totalidade da opção às pessoas privadas de liberdade. Antes de tudo, esta implica convívio, relacionamento fraterno, atenção, escuta, acompanhamento nas dificuldades, buscando, a partir das pessoas privadas de liberdade, a mudança de sua situação. Aspessoas presas são sujeitos da evangelização e da promoção humana integral. (CNBB – Nº 94, parg. 71)

3) Luta para cancelar toda legislação e normas contrárias à dignidade e aos direitos fundamentais às pessoas privadas de liberdade, assim como as leis que dificultam o exercício da liberdade religiosa em benefício dos reclusos e busca, a quem transgride o caminho, o resgate e uma nova e positiva inserção na sociedade.

4) Respeita a dignidade da pessoa humana. Isso significa tratar o ser humano como fim e não como meio, não o manipular como se fosse um objeto; respeitá-lo em tudo que lhe é próprio: corpo, espírito e liberdade; tratar as pessoas presas como ser humano sem preconceito nem discriminação, acolhendo, perdoando, recuperando a vida e a liberdade de cada um, denunciando os desrespeitos à dignidade humana e considerando as condições materiais, históricas, sociais e culturais em que cada pessoa vive.

Evangelização e promoção da dignidade humana por meio da presença da Igreja nos cárceres, através das equipes de pastoral na busca de um mundo sem cárceres!

Lutar pelo fim da política de encarceramento em massa no país, através do desencarceramento da população carcerária;

Encaminhar as denúncias de torturas, maus-tratos e violações de direitos humanos praticados contra as pessoas privadas de liberdade;

Priorizar a defesa intransigente da vida, bem como a integridade física e moral das pessoas privadas de liberdade;

Conscientizar a sociedade para a difícil situação do sistema prisional;

Superar a justiça retributiva por meio da justiça restaurativa;

Acompanhar as pessoas privadas de liberdade em todas as circunstâncias e atender suas necessidades pessoais e familiares;

Reuniões de formação, atualização e de espiritualidade da equipe da Pastoral Carcerária.

Linha do Tempo

Década de 1960: A Igreja se faz presente nos cárceres (cadeias e penitenciárias femininas) através das Irmãs do Bom Pastor.

Década de 1970: Na década de 70, movimentos religiosos realizaram um trabalho edificante nos presídios onde foram permitidos atuar: organizavam jogos e diversões, promoviam reuniões, cursos e “Reflexões Bíblicas”; realizavam celebrações litúrgicas e visitavam os presos e suas famílias.

Década de 1980: As Irmãs de Consolata entraram na pastoral Carcerária (Irmã Daniela, Irmã Ananias) e se dedicaram por muitos anos aos presos da Casa de Detenção .

1985: Padre Chico começa a visitar a Casa de Detenção e logo, em seguida, forma um Grupo de voluntários; iniciaram visitando o Pavilhão 7. Aos poucos as reuniões foram acontecendo e a PCr foi tomando rumo e tentando ser uma Igreja dentro dos Presídios.

1986 – Primeira reunião nacional da Pastoral como serviço organizado da CNBB;

1988

Criação da coordenação nacional e início de contatos com organizações nacionais e internacionais que contestam o sistema penitenciário;

Dom Paulo Evaristo Arns nomeia uma nova equipe de Coordenação da PCr: Sr. Itamar Bopp Jr, Irmã Maria Emília e Padre Chico.

Os trabalhos tomaram mais corpo com formação, reuniões e assembléias 4 a 5 vezes por ano. A partir de 1988 Padre Chico passa a ser Coordenador Nacional da Pastoral Carcerária.

Outros presídios, como o Centro de Observação Criminológica(COC), Distritos Policiais (DP) e alguns da capital e ABC começam a ser visitados

1992 – Massacre do Carandiru, que abriu as veias do sistema penitenciário para a sociedade. Pastoral se torna uma referência para aqueles que contestavam as políticas oficiais de repressão e o sistema penal como um todo;

1995 – Ano de total abandono do preso pela sociedade e pelo estado. A Pastoral Carcerária continua a questionar e a cobrar das autoridades, sem respostas, e começa a se organizar em nível de Estado e nacional.

1997 – Com o tema “Fraternidade e os Encarcerados”, tendo como lema “Cristo liberta de todas as prisões”, a Campanha da Fraternidade de 1997, motivada pela CNBB, dá maior visibilidade para a situação das pessoas presas e as violências promovidas pelos cárceres no Brasil, além de impulsionar os trabalhos da Pastoral em todo o país.

2000 – Padre Valdir João Silveira é eleito como coordenador da Pastoral Carcerária da Arquidiocese de São Paulo.

2006 – Pastoral compõe, junto com outras organizações, a primeira formação do Comitê Nacional de Prevenção e combate à Tortura;

2010 – Publicação do primeiro relato de monitoramento de locais de privação de liberdade, que oferece um mapa das ocorrências de tortura em cerca de 20 estados;

2013 – Reunião com a presidenta Dilma Roussef, na qual representantes da Pastoral Carcerária e outros movimentos sociais apresentam pela primeira vez a Agenda Nacional pelo Desencarceramento;

2016

Lançamento do relatório Tortura em Tempos de Encarceramento em Massa, resultante de acompanhamento e análise do Sistema de Justiça em 105 casos de tortura denunciados.

Ocorre o I Encontro Nacional pelo Desencarceramento, com a presença de representantes de 34 organizações e movimentos, que reafirmam os princípios da Agenda.

2017 – Nos primeiros dias do ano ocorre o maior ciclo de massacres da história ocorre o maior ciclo de massacres da história do sistema prisional brasileiro, que deixam mais de 130 presos mortos no Amazonas, Rio Grande de Norte e Rorâima, e que termina por confirmar de forma trágica a avaliação da Pastoral Carcerária no que tange à crescente degradação da realidade prisional e a completa inadequação das atuais políticas.

A Pastoral Carcerária é uma Pastoral sócio-transformadora, que tem sua fonte na Doutrina Social da Igreja Católica. Sua ação pastoral envolve toda a pessoa, suas necessidades, suas aspirações e sonhos.

O cuidado com a ecologia integral a leva a trabalhar para o “mundo sem cárceres” e na construção de um mundo mais solidário e fraterno.

Seguindo Jesus, como ele consagra todas suas energias para proclamar o ano favorável da parte do Senhor, anunciando a Boa Nova aos pobres; proclamar a libertação dos cativos e aos cegos a recuperação da vista; e mandar em liberdade os oprimidos (Lc. 4,18).

A PCr é também samaritana (Lc.10,29-37), curvando-se sobre os caídos de todos os tempos, cuida dos abandonados entre os mais abandonados, os esquecidos que a sociedade do consumo joga nos porões da história, colocando em suas feridas o óleo da verdadeira justiça: a misericórdia divina.

Gestada pelo Concílio Vaticano II, viu a luz em Medellin, cresceu em Puebla e se tornou adulta em Aparecida, assumindo como seu foco principal os pobres e os rostos sofridos dos povos latino americanos.

Hoje, a PCr continua visitando e consolando os Cristos que não tem lugar e direito à cidadania em nossos templos e em nossas cidades.

E como Maria, discípula missionária, visita as “Marias” condenadas por um sistema iníquo à esterilidade, acompanha as famílias nos exílios a que os Herodes de nosso tempo as obrigam.

A Pastoral Carcerária continua é uma pequena semente de mostarda, alimentando na Igreja e na história da humanidade a utopia e a profecia, de novos tempos em que viveremos a era da “terra sem males”.

O primeiro elemento que encontramos é um circulo aberto. É um universo em que se vai construindo uma nova humanidade uma nova espiritualidade. Ele é aberto porque o projeto está em constante mudança, movimentação, construção, redefinição. Ele precisa de uma nova educação.

Dentro do círculo encontramos uma forma que nos lembra uma colina sobre a qual estão colocados três palanques, que unidos formam uma grade. O palanque está vazio e as grades estão abertas, sinal de que começou um momento novo, uma nova criação e que surgiu uma nova humanidade, uma nova sociedade. É o mundo sem cárceres.
Mas o círculo nos remete também a um o pão e o corpo de um peixe. O pão representa a partilha, o banquete, a eucaristia. É a fonte de vida nova que é serviço, fraternidade, paz, misericórdia e justiça.

A cauda do peixe, com uma esfera na parte final, mostra a silhueta de um ser humano que constitui uma unidade, com o resto do corpo lembrando para nós a dimensão fundamental de que nossa vida tem sentido se unida, enxertada em Cristo. Ao mesmo tempo é o homem novo que em Cristo Ressuscitou. Nele nós temos vida plena e abundante (Jo.10,10).

Esse ser humano está de pé, erguido e com os braços abertos, numa atitude de exultação e alegria plena, porque banhado no sangue de Cristo, ele enxerga e experimenta a vida da nova criação, a de Jesus que é o Salvador.

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