Jornal da Arquidiocese de Goiânia retrata os trabalhos da Pastoral Carcerária

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Interna_Superior_jornal_goianiaO Estado de Goiás contra tem 12.866 presas em 87 unidades prisionais, segundo a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária e Justiça de Goiás, muitas dessas na capital Goiânia (GO). Em atenção a elas, a Pastoral Carcerária local desenvolve atividades desde 1995, num trabalho iniciado por dom Antonio Ribeiro de Oliveira, então arcebispo, junto a outras pessoas que formaram uma equipe para favorecer a assistência religiosa e humana aos presidiários e seus familiares.
O histórico e as iniciativas atuais de ação da PCr de Goiânia foram tema de uma reportagem publicada no Jornal Encontro Semanal, da Arquidiocese de Goiânia, na primeira semana de julho.
“Nós conversamos com elas [pessoas presas], às vezes somente escutando desabafos, relatos de suas vidas, sofrimentos; falamos sobre o amor de Deus, fazemos orações, promovendo celebrações periódicas da Eucaristia e da Palavra”, explicou à reportagem o coordenador da Pastoral na Arquidiocese, o diácono Ramon Curado.
Também entrevistada, a vice-coordenadora da Pastoral Carcerária Nacional, irmã Petra Silvia Pfaller, Missionária de Cristo, que atua em Goiânia, fez um apelo. “Não se esqueçam das pessoas presas. Infelizmente poucos da nossa Igreja aceitam o chamado de Deus para visitar os cárceres. É um trabalho gratuito e generoso que não tem como medir, mas vemos os resultados nos corações de cada uma das pessoas presas”.
Abaixo segue a íntegra da reportagem, assinada pelo jornalista Fúlvio Costa.
Ação Pastoral da Igreja nas Prisões
Interna_inferior_jornal_goianiaO Brasil conta com cerca de 550 mil detentos nas prisões e um déficit de 200 mil vagas, segundo dados do Alto Comissariado de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. No mundo, somos um dos principais países que mais desrespeitam os direitos humanos. As prisões estão superlotadas, não há higiene, e milhares de pessoas estão esquecidas à própria sorte pela sociedade e pelas autoridades. Esses são alguns dados que fazem da Pastoral Carcerária (PCr) uma missão indispensável que deve ser abraçada por toda a Igreja.
Nascida em 1986, por iniciativa da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com o objetivo de ver um mundo sem cárceres, a Pastoral Carcerária é organizada por grupos presentes nos estados e e em 2/3 das dioceses do país. A luz do seu trabalho está no Evangelho de Mateus (25,36) que diz: “Estive preso e me visitastes” e a sua missão se desenvolve com o anúncio do Evangelho, passando pela promoção da dignidade humana e da escuta às pessoas presas.
Na Arquidiocese de Goiânia, a atuação da Pastoral se dá desde 1997, quando a CNBB desenvolveu a Campanha da Fraternidade daquele ano que teve como lema “Cristo liberta de todas as prisões”. O então arcebispo, Dom Antonio Ribeiro de Oliveira, havia começado a organizar a PCr dois anos antes, em 1995, com a formação de uma equipe cujo objetivo era “favorecer a assistência religiosa e humana aos presidiários e seus familiares” no antigo Cepaigo, hoje Penitenciária Odenir Guimarães (POG), na Casa de Prisão Provisória (CPP) e em delegacias.
Faz parte dessa história o padre Francisco Nisoli, pároco da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, no bairro Solange Park I, em Goiânia. Ele trabalhou na Pastoral de outubro de 1998 até 2005. Na época, a PCr propunha a cooperação de todas as paróquias e comunidades, com ênfase na atenção aos direitos humanos e em relação aos familiares dos detentos.
“Os familiares precisam do apoio e da presença da Igreja, pois são deixados sozinhos pela sociedade e, na maioria dos casos, também pelos cristãos”, comenta o sacerdote. Na época, foi proposto às comunidades esse “cuidado” através das pastorais já existentes (Vicentinos, Pastoral Familiar), mas o retorno foi ínfimo. “Muitos não entendem ou até criticam a ação da Pastoral Carcerária. Diante disso, é necessário analisar bem qual é a fonte que gera um mundo violento; não é o crime, mas a violência profunda que está dentro da sociedade”, afirma.
Os trabalhos da Pastoral se dão às terças-feiras, no período vespertino, quando cerca de oito a dez voluntários se deslocam até o sistema prisional. A Arquidiocese fornece os meios necessários para o deslocamento. Os agentes da PCr percorrem celas e pátios onde estão recolhidas as pessoas presas. “Nós conversamos com elas, às vezes somente escutando desabafos, relatos de suas vidas, sofrimentos; falamos sobre o amor de Deus, fazemos orações, promovendo celebrações periódicas da Eucaristia e da Palavra”, explica o coordenador da Pastoral na Arquidiocese, o diácono Ramon Curado.
Além disso, são feitas anotações dos nomes para verificação do andamento de processos na justiça e oferecidas orientações e encaminhamentos, quando solicitados pelos detentos. Em casos mais graves, quando ocorrem denúncias de maus tratos ou de mortes de presos, os agentes da Pastoral procuram intervir junto às autoridades ou mesmo se deslocando até o local. É um trabalho totalmente gratuito que procura refletir as palavras do Evangelho.
A vice-coordenadora da Pastoral Carcerária Nacional, irmã Petra Silvia Pfaller, Missionária de Cristo, atua em Goiânia e faz um apelo. “Não se esqueçam das pessoas presas. Infelizmente poucos da nossa Igreja aceitam o chamado de Deus para visitar os cárceres. É um trabalho gratuito e generoso que não tem como medir, mas vemos os resultados nos corações de cada uma das pessoas presas”.
Esse trabalho é conhecido, admirado e acompanhado pelo promotor de justiça, Dr. Haroldo Caetano da Silva, há pelo menos 20 anos. “É a mais brava e corajosa instituição brasileira na defesa dos Direitos Humanos no cárcere”, elogia. Nas palavras dele, trata-se de um trabalho que vai muito além da evangelização. “Os seus voluntários e missionários entram em lugares onde as autoridades temem chegar perto; conversam e conhecem as agruras da pessoa presa, de sua família; e veem de dentro do sistema prisional o resultado produzido pelos erros de uma política criminal nefasta e burra”.
O promotor acusa o sistema carcerário de ser o principal responsável pelos altos índices de reincidência: sete em cada dez presos que deixam o sistema penitenciário voltam ao mundo do crime, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Não há programas nem políticas públicas de acolhimento dos egressos do cárcere”, justifica.
Nivaldo Ribeiro Trindade esteve preso por 12 anos. Ele é um exemplo. Conquistou a liberdade condicional há cinco anos, mas por diversas vezes voltou à prisão. “Consegui trabalho formal em apenas uma oportunidade, mas quando descobriram que eu fui detento, me mandaram embora. Depois disso só trabalhei de forma autônoma e mesmo assim sendo perseguido pela sociedade e pela própria polícia”, lamenta. Nivaldo tem hoje 48 anos, é casado e pai de cinco filhos. O mais velho tem 12 anos. O homem, negro, de corpo franzino, que aprendeu a ler e escrever quando esteve preso, conheceu a Pastoral Carcerária no presídio. Diz que a cada novo dia trava uma batalha contra si mesmo para não retornar ao cárcere. Sem trabalho, vivendo apenas das doações de cestas básicas da Pastoral Carcerária, nunca sabe como será o dia seguinte. Do presídio, herdou marcas por todo o corpo: cicatrizes, uma costela quebrada, desvio na coluna e osteoporose. “A vida na prisão é um inferno ao qual eu jamais quero voltar. Graças a Deus conhecei a Pastoral, pois sem ela aquele lugar seria muito pior. Eu mesmo não sei o que seria da minha vida sem conhecer esses irmãos”, agradece.

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