‘Vamos sentir de perto as dores e os sofrimentos de cada pessoa’, garante assessor de saúde da PCr

 Em Combate e Prevenção à Tortura

Padre AlmirCom experiência na área da saúde desde 1990, Padre Almir José Ramos, 44, coordenador da Pastoral Carcerária no Estado de Santa Catarina, aceitou um novo desafio neste mês de março: a função de assessor nacional de saúde da Pastoral Carcerária. Em entrevista ao Site da PCr Nacional, ele comenta o panorama da saúde prisional no Brasil e se mostra disposto a ampliar a capacidade de atuação da Pastoral nesse segmento.
“Vamos conhecer a realidade de cada região, sentir de perto as dores e os sofrimentos de cada pessoa, ouvir suas queixas. Depois, vamos ver o que podemos fazer, o que podemos construir, articular juntos desde os irmãos e irmãs encarcerados até nossos animadores e animadoras das comunidades, nossos padres, bispos religiosos e religiosas, as forças políticas locais e todas as pessoas de boa vontade que queiram somar forças para enfrentarmos os desafios da missão”. Leia a seguir a íntegra da entrevista.
 
Site PCr Nacional – Como foi a escolha do senhor para ser o assessor nacional de saúde da Pastoral Carcerária?
Padre Almir José Ramos – Na última Assembleia Nacional da Pastoral Carcerária, no ano passado, foi discutido sobre a necessidade de termos assessores em algumas áreas específicas, dentre elas a saúde. Assim sendo, conhecendo o meu trabalho específico na área da saúde, e nos presídios aqui no Estado de Santa Catarina, foi que o Padre Valdir João Silveira, juntamente com a coordenação nacional da Pastoral, me convidou para essa missão.
 
Site PCr Nacional – Quais as experiências do senhor na área da saúde e o histórico de atuação na Pastoral Carcerária?
Padre Almir – Eu comecei a trabalhar na área da saúde em 1990 no Hospital e Maternidade de Santa Cecília (SC). De lá para cá, nunca mais parei, sempre trabalhei em hospitais mesmo depois que fiquei padre. Estudei enfermagem pela Escola de Enfermagem Nossa Senhora dos Anjos das Irmãs dos Santos Anjos, em Caçador (SC). Depois de formado, trabalhei em diversos hospitais: Hospital Maicé, em Caçador (SC), Hospital de Caridade, em Florianópolis (SC) e Hospital Nereu Ramos também em Florianópolis. Gostaria de destacar aqui o meu trabalho nos Hospital Nereu Ramos, que é referência em doenças infecto contagiosas e que acolhe muitos presidiários acometidos por tuberculose, AIDS e meningite, e também no Hospital de Santa Cecília, que é referência em saúde mental e dependência química, no qual também muitos presos ficam internados. Já atuei na Pastoral da Saúde e da AIDS. Também sou servidor público efetivo da Secretaria Estadual da Saúde, atuando em um hospital público de Santa Catarina. Na PCr, estou há cerca de 10 anos. Quando era seminarista, visitava o presídio no Complexo da Agronômica, em Florianópolis. Depois, continuei participando em outros lugares onde passei, como padre na Diocese de Lages e Caçador. Atualmente, estou na coordenação estadual da Pastoral e na Secretaria da Saúde na implantação de um programa de saúde nos presídios.
 
Site PCr Nacional – Com quais expectativas o senhor assume essa nova missão na Pastoral Carcerária?
Padre Almir – Guiado pelo sonho que alimenta a missão e a militância de todos e todas na Pastoral: Um mundo sem cárcere! Vamos conhecer a realidade de cada região, sentir de perto as dores e os sofrimentos de cada pessoa, ouvir suas queixas. Depois, vamos ver o que podemos fazer, o que podemos construir, articular juntos desde os irmãos e irmãs encarcerados até nossos animadores e animadoras das comunidades, nossos padres, bispos religiosos e religiosas, as forças políticas locais e todas as pessoas de boa vontade que queiram somar forças para enfrentarmos os desafios da missão.
 
Site PCr Nacional – E o que pode ser aprimorado na Pastoral Carcerária em relação à atenção à saúde dos presos?
Padre Almir – O que é fundamental é que todos os agentes da Pastoral Carcerária tenham bastante clareza sobre alguns conceitos sobre saúde e doença. Também é preciso que esses mesmos agentes conheçam algumas leis e normas que dizem respeito ao SUS. Também é imprescindível que tenhamos clareza sobre a assistência farmacêutica no âmbito do SUS, bem como outros direitos que todos temos, inclusive os detentos. Às vezes, é mais fácil para a Pastoral fazer uma campanha e arrecadar verbas para comprar os remédios ou reformar, ou então construir um ambulatório no presídio do que conhecer ou fazer valer a lei que é um direito do preso e um dever do estado. Muitos remédios que eles usam estão disponíveis (ou deveriam estar) nas farmácias básicas ou na especializada ou então nas farmácias populares.
 
Site PCr Nacional – No entender do senhor, quais são as principais urgências na área de saúde das prisões em âmbito nacional?
Padre Almir – Como dizia antes, é preciso em um primeiro momento conhecer a realidade, no entanto fica difícil fazer um diagnóstico prévio principalmente ao falarmos de um país com as dimensões do Brasil. Também temos o fator climático, o qual interfere muito nas patologias existentes em cada região, são as chamadas doenças regionais. Existem doenças que aparecem em uma determinada região e não aparecem em outra, isso afeta diretamente o sistema prisional. Temos também o fator sanitário que causa doenças, também ocasionando o surgimento de algumas doenças em uma determinada região e não aparecendo em outras. Temos, ainda, o fator epidemiológico, que também pode ocasionar epidemias em uma região e não afetar outra. Porém um dado é certo: algumas patologias são comuns no mundo prisional e acometem praticamente todos os presídios: tuberculose, AIDS, doenças mentais, e algumas doenças crônicas como hipertenção arterial, diabetes, dentre outras.
 
Site PCr Nacional – Em médio prazo, o senhor acredita em soluções estruturais e definitivas para os problemas dos serviços de saúde dos presos ou a tendência são de soluções pontuais por parte dos governos?
Padre Almir – Existe um Programa de Saúde nos Presídios, do Ministério da Saúde, que está sendo implantado em vários estados. O programa em si tem vários pontos positivos e vários negativos, mas em linhas gerais, percebe-se que a coisa não vai funcionar. A maior dificuldade é conseguir os profissionais que o programa exige pelo salário que eles estão oferecendo. Eu vejo que a Pastoral Carcerária tem uma missão muito nobre nesse sentido, pois, muitas vezes, somos nós que ouvimos as queixas desses irmãos e irmãs e as levamos até as autoridades competentes. Muitas vezes, somos nós que temos que brigar por eles. No panorama atual, em um âmbito geral, fica difícil ver uma solução definitiva para um problema tão arraigado em um universo tão amplo, porém, temos iniciativas isoladas em várias unidades prisionais, que apontam para uma luz no fim do túnel, como o grupo de Saúde Mental em São Paulo e um grupo de Saúde Natural e Acumpuntura, no Presídio feminino de Tubarão Santa Catarina, dentre outros. Da parte do governo, penso que esse Programa de Saúde nos Presídios é bom, mas precisa ser revisto antes de ser totalmente implantando ou se deve buscar alternativas, como o Mais Médicos, mais enfermeiros, mais dentistas etc, no âmbito das prisões.

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