Indulto presidencial mantém violação de direitos dos presos, avaliam especialistas

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Por Arthur Stabile
Da Ponte Jornalismo

O presidente Jair Bolsonaro decretou indulto presidencial para presos, diferentemente da promessa feita em campanha de não fazê-lo. Porém, o texto publicado no Diário Oficial desta segunda-feira (11/2) mostra que, apesar de mudar de ideia, o ex-capitão do Exército brasileiro impôs uma série de restrições aos beneficiados pela ação.

O benefício vale para presos para ou tetraplégicos, que ficaram cegos após o cometimento do crime (ou durante a prática, caso confirmada em laudo) e portadores de doenças graves em estágio terminal, entre elas câncer, Aids e outras. Todos estão aptos a receber o benefício. Porém, Bolsonaro aplicou um limitador que causa forte impacto na quantidade de beneficiados.

O texto é explícito que pessoas condenadas por tráfico de drogas e crimes hediondos, mesmo com graves debilidades físicas, não serão beneficiadas pelo indulto. Ainda que em estado terminal, quem tenha praticado um homicídio, lesionado gravemente um agente de segurança, latrocínio, extorsão mediante sequestro, entre outros, seguirão na cadeia de acordo com o decreto, assinado pelo presidente e pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro.

Outro ponto que restringe a obtenção do indulto é que apenas réus primários condenados serão cobertos pela medida. Tanto a defesa da pessoa condenada quanto o Ministério Público serão consultados pelo juiz que determinou a sentença. Só assim ele validará, ou não, o indulto. Réus cujo processo está em suspensão condicional também ficam fora da liberação.

Inicialmente, o presidente havia se recusado à liberar o indulto. À época, quando ainda era candidato, afirmou que, se o governo de Michel Temer liberasse a medida, seria reavaliada. Porém, Bolsonaro recuou e preferiu aderir ao indulto, ainda que restringindo sua aplicação. Segundo o porta-voz do Governo Federal, general Otávio Rego, o presidente não recuou, mas “amadureceu” a ideia.

‘Perpétua a exclusão’

O decreto é criticado por especialistas. “Chama a atenção a exclusão de alguns delitos, deixando pessoas com doenças graves em situação diferente de outras de acordo com o crime que cometeram. É uma coisa que não faz muito sentido, porque o decreto de indulto humanitário é um texto que visa evitar que pessoas sofram a mais do que estabelecido em lei”, analisa Hugo Leonardo, integrante do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa).

Para Leonardo, as condenações mais severas aplicadas a essas pessoas, por si só, é punição suficiente para o crime praticado. “Se elas já foram condenadas a penas mais graves pelos delitos serem mais graves, não faz sentido perpetuar a exclusão, a aniquilação dessas pessoas, independentemente do crime”, conclui.

O advogado Rafael Custódio, coordenador do Programa de Violência Institucional da Conectas, comemorou que o governo “entendeu que a medida é importante”, mas que destaca a maior exclusão do atual indulto por Bolsonaro em comparação com a mesma medida tomada em governos anteriores.

“Chama a atenção que o indulto é tímido, extremamente limitado, e que provavelmente gere pouco impacto no sistema. Seria importante que o governo tivesse ampliado os critérios para concessão do benefício, alargando o número de pessoas atingidas e contribuindo de maneira mais efetiva para a racionalização do sistema”, analisa o advogado.

Custódio pontua que o indulto presidencial serve como “medida humanitária por natureza e, num sistema prisional caótico e violador de direitos como o nosso, uma medida muito importante na gestão prisional, já que temos presídios superlotados e em péssimas condições”, completa.

Para além disso, há críticas quanto ao esquecimento das mulheres. “Coloca-se como um indulto humanitário, mas só é focado em saúde, deixa de levar em consideração mulheres gestantes, mães com filhos de até 12 anos, por exemplo. A maioria está presa acusada de tráfico de drogas. Todas [as mulheres que se encaixam nesses quadros] estão fora”, alerta Viviane Balbuglio, advogada e integrante do projeto Migrantes Egressas do ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania).

Um destaque da advogada é para a falta de comutação, alternativa que possibilita a aplicação de penas alternativas. Segundo ela, esse é apenas o segundo decreto desde a ditadura militar que não inclui essa possibilidade. “Vemos nas falas do Governo Federal que ele está ligado ao discurso punitivista, o governo pauta o retrocesso. As medidas do decreto, por mais que os antigos não avançassem tanto na ampliação dos beneficiários, como tráfico de drogas, este indulto atual demonstra retrocesso maior”, explica.

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