Com taxa de aprisionamento 52% acima da média, São Paulo estuda privatizar cadeias

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Por Juca Guimarães
Do Brasil de Fato

O governador João Doria (PSDB) encomendou um projeto de privatização dos presídios de São Paulo. O modelo encarece o custo para os contribuintes e mantém os mesmos problemas do sistema convencional como motins, fugas, atuação de facções e rebeliões.

Com uma massa carcerária de 240 mil presos, que representa 33% dos detentos do país, São Paulo tem uma taxa de aprisionamento 52% acima da média do Brasil o que causa super-lotação, com um déficit de 108 mil vagas nos presídios, todos eles em regime de gestão pública, de acordo com o Infopen, relatório do Ministério da Justiça e da Segurança Pública.

Não há nenhuma pesquisa comprovando que o sistema privado seja mais eficiente na gestão de presídios – SAP

A taxa de aprisionamento é o coeficiente do total de pessoas presas para cada grupo de 100 mil habitantes. O Estado de São Paulo, tem uma taxa de aprisionamento de 536,5 detentos para cada 100 mil paulistas, enquanto a média nacional é de 352,5 presos por 100 mil.

O sistema de parceria público-privada (PPP), também conhecido como co-gestão, tem custos maiores, de 60% a 100% a mais que o convencional, de acordo com especialistas na área (ver abaixo), e atualmente é adotado em algumas unidades prisionais no Amazonas e Minas Gerais.

Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, o estudo para “a formatação de uma parceria público privada inédita no Estado” está sendo feito em conjunto com a Secretaria de Governo e os detalhes devem ser apresentados “em breve”. O atual secretário da pasta é o coronel Nivaldo Restivo, ex-comandante de Polícia Militar.

“Essa transferência da administração penitenciária para uma empresa privada não parece ser uma boa ideia do ponto de vista das condições de aprisionamento. A lógica do lucro das empresas privadas impede investimentos e melhorias que garantam direitos sociais a esses presos. [Atualmente] eles [os presídios] são administrados, da porta para dentro, quase que exclusivamente, pelos próprios presos e não pela empresa e muito menos pelo Estado”, disse o defensor público Bruno Shimizu, doutor em Direito Penal e Criminologia pela USP e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).

A primeira experiência de parceria público-privada em presídios brasileiros foi em Ribeirão das Neves, na grande Belo Horizonte (MG), administrado pela empresa GPA e inaugurada há seis anos.

De acordo com o defensor público não existe nenhuma pesquisa séria que comprove uma eficiência maior da gestão privada no sistema prisional, que ele considera “caótico e inconstitucional”.

“Para que se vendesse esse modelo de privatização por PPP foram tomadas algumas medidas para que essas empresas fossem favorecidas, por exemplo, no próprio corte [triagem] dos presos que serão encaminhados. São presos primários e sem envolvimento com facções”, comentou Shimizu.

O valor que o governo paga para as empresas privadas realizarem a gestão dos presídios é maior que o gasto no modelo de administração pública, que é de R$ 1.700.

“Elas têm um custo pro Estado muito maior, que chega a ser de 60% ao dobro do que o de uma unidade pública. Em Minas Gerais, o governo repassa para essas empresas que administram a unidade privatizada de Ribeirão das Neves, cerca de R$ 3.500 por preso/mês, o que é praticamente o dobro daquilo que se gasta por preso quando se divide o orçamento da administração penitenciária pelo número de presos”, afirmou.

Para a advogada Dina Alves, que também é pesquisadora do sistema penitenciário, a privatização representa um incentivo ao superencarceramento para aumentar o lucro das empresas. Não à toa, grupos que defendem a privatização também defendem a redução da maioridade penal.

“Ela [a privatização] é a expansão do sistema penitenciário – tanto no que diz respeito a construção de novos presídios quanto ao superencarceramento, a entrada de pessoas no sistema e, consequentemente, a exploração da mão de obra dessas pessoas com trabalho análogo ao trabalho escravo ”, disse a advogada.

O último presídio inaugurado no Estado de São Paulo foi o CDP de Nova Independência, 700 quilômetros distante da capital. Com capacidade para 823 detentos, em uma área de 11 mil m² e custando R$ 47 milhões, ele foi entregue em novembro do ano passado

Outro lado

A maior empresa de gestão privada de presídios da América Latina é a Umanizzare, com sede em São Paulo, e atuação em seis unidades prisionais no Amazonas com aproximadamente 4.600 detentos. A empresa já realizou projetos em outros estados do país e também no Uruguai.

Segundo o diretor jurídico André Caires, a Umanizzare tem interesse em participar do projeto de privatização em São Paulo.

Caires defende que a privatização, por meio da co-gestão, pode ser aplicada em 100% do sistema, pois é uma operação livre da burocratização do Estado e mais ágil na execução. Ele destaca que a empresa privada é responsável pelas atividades como alimentação, serviços, limpeza, oficinas, cursos de remissão de pena, entre outros, enquanto a parte de inteligência e controle ficariam por conta do setor público.

Em relação aos custos maiores, que incluem o lucro da empresa privada, o executivo da Umanizzare disse que a comparação com o valor da gestão pública é impreciso, pois não leva em conta, por exemplo, que quando um preso precisa de atendimento médico, a despesa é diluída na conta da Saúde, uma vez que o serviço é realizado pelo SUS. Por outro lado, no presídio privado a equipe de saúde é própria. No Amazonas, a empresa tem 1.500 funcionários.

No caso dos problemas típicos do sistema prisional, como os motins, Caires disse que o sistema de co-gestão privado tem, pelo menos, maior agilidade de reorganização. Ele cita como exemplo uma rebelião que aconteceu em Manaus em 2017, quando a rotina da unidade foi totalmente reestruturada 48 horas após o fim da rebelião.

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira

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